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Reinaldo Azevedo

Barbosa presidente? Bem, só pode dar certo se der errado. Se der certo, só pode dar errado. Juiz pode ser imperador; presidente é plebeu

Reinaldo Azevedo

23/04/2018 07h49

Joaquim Barbosa: ex-ministro do STF entra na disputa, ou mais ou menos, com sotaque imperial

Por enquanto, o passar dos dias só contribui para aumentar a imprevisibilidade na política. E o marco principal nesse terreno, é, obviamente, a eleição presidencial. Convenham: estamos a menos de seis meses do primeiro turno da disputa, no dia 7 de outubro, e qualquer coisa pode acontecer. É claro que um país assim está com problema.

A sensação da hora é Joaquim Barbosa, ex-ministro do Supremo, que decidiu, finalmente, filiar-se ao PSB, mas negando, por enquanto, que já tenha decidido ser candidato. Convenham: não há nada de estranho nisso, dado o contexto. Assumir-se como tal corresponderia a expor-se. E, aqui e ali, já começam a surgir reportagens, pautadas pelo que chamo de "Partido da Polícia", sustentando que o homem já se tornou um alvo. Alvo? É mesmo?

Fica parecendo que, numa disputa democrática, há algo de ilegítimo em um concorrente criticar o outro ou chamá-lo para o embate. Curioso: verifico o processo eleitoral em todas as democracias do mundo e vejo que as coisas são assim mesmo. Só não se critica o candidato ao poder nas ditaduras e semiditaduras. Na China, não pode. Em Cuba, não pode. Na Rússia, não pode. Nem na Turquia. Com ou sem voto popular, os mandatários nesses regimes atendem a uma camarilha. No Brasil, por enquanto ao menos, a crítica não é apenas um direito. Também é um dever. E refiro-me, claro!, à parte séria da imprensa, que não faz trabalho partidário.

Para tentar saber o que pensa Joaquim Barbosa, o Estadão resolveu ler uma meia-dúzia de votos que ele deu nos 11 anos em que permaneceu no Supremo, de onde saiu por razões que nunca ficaram claras. Não! Ele nem estava sendo ameaçado nem era justo demais para conviver com os outros 10. Deixou o STF porque ficou de saco cheio. Ponto.

Será que um político decide com a mesma liberdade com que pode votar um juiz? A resposta é escancaradamente negativa. Será que um presidente da República pode se dar ao luxo, se preciso, de ser uma sentença solitária, às vezes idiossincrática, apegada, não raro, à sua própria vaidade, recorrendo à Constituição quando isso lhe parece útil e dela fugindo quando lhe soar necessário, sem precisar dar muita bola para a torcida?

A verdade é que não sabemos o que Barbosa pensa sobre economia, sobre política, sobre costumes, sobre coisa nenhuma. Eu, por exemplo, achei a sua atuação como presidente do STF uma lástima. Irascível, estridente, agressivo, intolerante com o direito de defesa… Sei que essas características fizeram a sua fama e o catapultaram aos 9% que obtém na pesquisa Datafolha quando Lula não está no cenário. Ou por outra: não obtém essa marca, sem dúvida apreciável, dado o contexto, em razão de suas qualidades. Essa preferência me parece estar pautada por aquela percepção de que a política precisa de um novo nome, que dê murro na mesa. NÃO CUSTA NOTAR QUE AINDA FORMAM UMA EXTREMA MINORIA OS QUE COMPRAM O SEU DISCURSO. Isso não quer dizer que não possa crescer.

A unanimidade das pessoas que conheço acha que ele será mesmo candidato. Ainda não estou convencido disso. Pode estar mais para "não" do que para "sim".

De toda sorte, o fato de ser ele a esperança da vez expõe de forma dramática a miséria do quadro político brasileiro. Por quê? Porque notem que Barbosa se apresenta, desde a partida, como candidato a imperador. De corte napoleônico, é claro. A síntese é a seguinte: só pode dar certo se der errado. Se der certo, só pode dar errado. Na República, juiz pode ser imperador. Um presidente é necessariamente plebeu.

 

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.