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Reinaldo Azevedo

Bolsonaro repete fala do PT, mas, covarde, vota a favor da intervenção; deputado rouba discurso de colunistas anti-Temer

Reinaldo Azevedo

21/02/2018 00h29

Jair Bolsonaro, que ataca a intervenção, mas vota a favor. Ele só não é petista por falta de coragem. O discurso econômico, por exemplo, é o mesmo…

Muitos dos defeitos do deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ) eram conhecidos. Agora ele revela um outro. É de uma covardia política asquerosa. Até ontem, eu supunha que os fanáticos que o seguiam eram apenas desinformados ou intelectualmente malformados. A partir de agora, começo a desconfiar de algo mais sério. Pode se tratar de gente com uma grave falha moral. Por que afirmo isso?

Tão logo o governo federal anunciou a intervenção na área de segurança pública no Rio, o deputado soltou seus perdigotos gramaticais, na forma de anacolutos morais, contra a decisão. Disse que as Forças Armadas, em nome das quais ele tem a estúpida ousadia de falar, iriam servir a vagabundos. Como sabemos, gente valorosa é a Família Bolsonaro. Se formos levar em conta o patrimônio que a turma amealhou na política, ponha valor nisso… Se alguém não lembra quem é o deputado Bolsonaro, é aquele senhor que disse ter usado o auxílio-moradia para comer gente… Ainda não sei se caberia uma denúncia do Ministério Público Federal por, deixem-me ver, canibalismo…

Muito bem! Mesmo sendo contra, então, a intervenção, Jair, o pai, e Eduardo, o filho — aquele rebento que também é deputado federal e que estrelou um vídeo cercado de fuzis semelhantes ao empregado por Nikolas Cruz para massacrar colegas de escola —, votaram a favor da medida. O que pode fazer com que uma pessoa contrária a uma determinada medida não tenha a coragem de votar contra a dita-cuja? A resposta é uma só e estupidamente óbvia: a covardia.

Bolsonaro é desinformado. Isso já era público. Mas seus crentes o seguem mesmo assim porque estão convictos de que a ignorância pode ser tomada como expressão da sua sinceridade.

Bolsonaro incentiva a truculência. Isso já era público. Mas seus crentes o seguem mesmo assim porque estão convictos de que a brutalidade retórica pode ser tomada como expressão de autenticidade.

Bolsonaro incentiva a intolerância. Isso já era público. Mas seus crentes o seguem mesmo assim porque estão convictos de que o discurso do ódio pode ser tomado como expressão de sua fidelidade aos valores da família.

Agora, os crentes da religião da empulhação devem achar que a mais nova expressão da genialidade política é pensar uma coisa e votar no contrário, com receio de perder os votos não da grei de fanáticos, mas dos desavisados que caem na conversa do falso profeta.

Mas como explicar que ele possa repudiar uma medida, embora vote a favor dela? Ele se justifica num vídeo:
"Temer já roubou muita coisa aqui, mas o meu discurso ele não vai roubar, não. É uma intervenção política que ele está fazendo. Ele agora está sentado, lá não sei aonde, tranquilo, deitado. Se der certo, eu vou torcer para que dê certo, glória dele. Se der errado, joga a responsabilidade no colo das Forças Armadas".

Bem, se é assim, por que ele e seu filho deram o seu "sim" à decisão do presidente? Se é assim, como ele pode concordar com a decisão? Ah, ele explicou: é que Temer estaria querendo "roubar" o seu discurso…

É impressionante! O deputado está apenas repetindo o que leu em textos de alguns analistas de meia-tigela. Segundo esses gênios da análise política, ao optar pela intervenção — reconhecida pelo próprio governador do Rio como a única saída —, Temer estaria fazendo uma inflexão à direita para responder a uma demanda da sociedade que vinha sendo explorada pelo deputado.

Trata-se de uma farsa grotesca, de uma mentira, de uma estupidez sem par. A única proposta conhecida do deputado para responder à violência consiste em distribuir portes de arma a rodo, armar a população, extinguir o Estatuto do Desarmamento, facilitar a chegada de fuzis ao campo… Em suma, Bolsonaro, na prática, gostaria de dar uma resposta aos mais de 50 mil homicídios por ano no país criando as condições para que tal número chegasse a 60 mil, a 70 mil, a 80 mil…

Se não for um lobista vulgar e remunerado da indústria armamentista, então é só um tolo.

A intervenção federal caminha justamente no sentido contrário. O ministro da Defesa, diga-se, que está na coordenação geral desse processo, Raul Jungmann, é um conhecido defensor do Estatuto do Desarmamento e é, frequentemente, alvo da delinquência intelectual dos bolsonaristas…

Que tipo de gente vota a favor daquilo em que não acredita só para evitar, como é mesmo?, que seu "discurso" seja roubado? Mas noto, e saúdo aqui o fato, que aqueles analistas que vieram com essa conversa se colocam no nível intelectual de deputado, repetindo, quem sabe, o seu mesmo padrão moral.

Temer não roubou o discurso de Bolsonaro. Mas Bolsonaro roubou o discurso de alguns colunistas anti-Temer. Que gente patética!

Que Bolsonaro achasse a medida correta e votasse a favor dela seria compreensível; que a considerasse errada e votasse conta, idem. Fazer o que ele fez — repudiar a ação, mas acatá-la por meio do voto — é de uma covardia bisonha. E o que diz o "mito" a seus crentes? "Temer tentou roubar o meu discurso…"

Que tipo de gente cai nessa conversa?

Que tempos estes, né?, em que um Bolsonaro e um Delta Dallagnol conquistam adesões apaixonadas! Bem, este outro merecerá um post de presente, inteirinho pra ele! Vou sugerir um mandodo de busca e apreensão coletivo na Força Tarefa de Curitiba…

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.