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Reinaldo Azevedo

Eis a grande obra de Fux e Barroso: eles jogaram a eleição no colo dos ricos; saída alternativa é apelar ao crime organizado...

Reinaldo Azevedo

26/03/2018 08h10

Luiz Fux e Roberto Barroso: os efeitos danosos da obra dessa dupla desastrada de legisladores-usurpadores já começaram a aparecer

Se a imprensa tivesse dado mais atenção à substância do debate e menos ao chilique em linguagem de bolerão de quinta categoria de Roberto Barroso, teria prestado atenção ao conteúdo da intervenção do ministro Gilmar Mendes, na quarta, que acabou levando o outro àquele destampatório sentimental.

Mendes criticava as muitas vezes em que o Supremo, por intermédio de alguns supostos iluminados, tem se metido a legislador. O caso mais grave citado pelo ministro diz respeito, justamente, ao financiamento de campanha. Os patrocinadores da proibição da doação de empresas privadas foram Luiz Fux, relator do caso, e Barroso — que, pasmem!, era o autor do Ação Direita de Inconstitucionalidade que chegou ao tribunal. Ele a redigiu quando advogado da OAB na causa. Sim, ele não apenas votou num caso em que havia atuado como aprovou o próprio texto. E com alguns elogios, claro!

No seu fricote contra Mendes, acusou o parceiro de tribunal de não ter proposta. Barroso propõe demais. Por que ele não disputa eleição?

Mas volto ao ponto. Quando uma maioria de oito ministros decidiu declarar inconstitucional a doação de empresas privadas a campanhas, eles o fizeram ancorando-se no princípio da igualdade entre todos os brasileiros. A tese esdrúxula é a de que as doações de empresas desigualavam os cidadãos, já que os pobres não teriam como intervir do mesmo modo no processo e coisa e tal…

Não há uma vírgula na Constituição que vete a doação de empresas. É puro direito criativo. Aliás, Mendes desafiou a que alguém ali lhe apontasse onde estava o óbice constitucional. Ninguém se atreveu. Fux, o relator, admitiu que não há mesmo e se saiu com uma bobagem assombrosa, mais uma: disse que as irregularidades do petrolão evidenciavam o acerto da decisão… É mesmo?

Reportagem no Estadão de hoje, vejam vocês, informa que os partidos estão buscando candidatos ricos, que possam se autofinanciar. É que o limite do autofinaciamento chega às nuvens, R$ 70 milhões para a Presidência; R$ 21 milhões para o Senado; R$ 2,5 milhões para deputado federal… Vale dizer: os valentes do STF que se meteram a legislar estavam jogando, aí sim, a eleição no colo dos ricos. É bom lembrar: a doação de pessoas físicas tem um teto: 10% dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano fiscal anterior à eleição.

Digam-me: se eu quiser doar, os meus 10% serão iguais ao de alguns bilionários brasileiros? E os 10% do sr. José da Silva?

Será que fica claro o ridículo da proibição da doação de empresas?

Partidos recorreram ao STF contra o teto sem teto do autofinanciamento. O relator é o ministro Dias Toffoli, que já se posicionou contra a atual regra. Quando menos, convenham, ela é contraditória com a proibição da doação de empresas. E creio que essa posição tende a prevalecer.

Pois é…

A coisa dramática aí é a seguinte:
– a Constituição não impõe limites à doação de empresas;
– a Constituição não impõe limites ao autofinanciamento;
– a Constituição não impõe limites a doação de pessoas físicas.

Isso é matéria para legislador ordinário. Quando o Supremo resolveu meter a sua toga na história, inventando que está na Carta o que não está, em vez de melhorar as coisas, ele as piorou, e muito!, como destacou Mendes na quarta.

É que Barroso, o iluminado, tinha propostas. E Fux, aquele que inventou a própria lei do habeas corpus, também.

Certamente acabará havendo uma limitação ao autofinanciamento. Com ou sem ele, no entanto, a verdade é que os senhores que resolveram meter a sua toga onde não eram chamados fizeram com que crescesse a importância dos candidatos ricos a todos os postos.

Hoje, quem aparecer com o próprio dinheiro leva uma vaga para disputar a Câmara em quase todos os partidos.

Obra de Fux.

Obra de Barroso.

Obra dos que caíram na conversa da dupla do iluminismo das trevas. Ah, eles não gostam também de habeas corpus…

E tudo isso ainda é pinto perto do que virá. Sem as doações de empresas privadas, o crime organizado vai ter uma participação no pleito maior do que em qualquer outra disputa. Além de algumas igrejas cuja teologia é mais nova do que o uísque que eu bebo.

Obra de Fux.

Obra de Barroso.

Vejam quantos textos escrevi contra a proibição da doação de empresas, desde que o PT apareceu com essa tese em sua proposta de reforma eleitoral, em 2013.

Só que aí veio a Lava-Jato, e um véu de burrice militante e de moralismo xucro cobriu o debate e obnubilou as inteligências. Os conservadores responsáveis e a extrema-direita que ronca e fuça compraram a tese da esquerda. Intimidado por procuradores e pela estupidez militante, o Congresso não teve a coragem de resistir à pressão, também da imprensa. Deixou tudo como estava. E ainda houve idiotas que se manifestaram até contra o tal fundo público… Só faltou que defendessem que a democracia fosse financiada por ETs…

Na sua intervenção, Mendes lembrou que de um lote de quase 700 mil doadores privados em 2016, mais de 300 mil não tinham renda para fazer a doação que fizeram. A dupla de iluminados também responde por um laranjal no país de fazer inveja à Cutrale. No caso, são laranjas que fazem mal à saúde e à democracia.

Tarefa de juízes é julgar segundo as leis que temos. Quando se metem a legislar, não só não corrigem o mal original como causam malefícios novos.

Sem contar que não foram eleitos por ninguém.

Atuam como usurpadores da vontade do povo.

 

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.