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Reinaldo Azevedo

Esquerdistas e setores da imprensa põem em prática a Fase Dois da operação e falam tudo o que assassinos esperam que falem

Reinaldo Azevedo

16/03/2018 07h53

Lendo os jornais, sites ou assistindo à cobertura epicamente fúnebre feita nesta quinta pelo "Jornal Nacional", fica-se com a imprensa de que Marielle era a melhor tradutora do que se passa no Rio e uma voz que expressava a média do pensamento do povo carioca, fluminense ou brasileiro. É claro que o assunto merece visibilidade, e até se compreende o tom de indignação condoreira. Ocorre que a militância da vereadora expressava o pensamento de uma minoria do Rio e do país. Repudiar a execução, lastimar a ousadia dos criminosos, tomar o evento como um emblema da degradação da segurança pública no Rio, bem, tudo isso é legítimo, correto e atende aos princípios da objetividade jornalística, com falhas aqui e ali.

O que não dá para aceitar é que a humana e justa indignação ceda a uma leitura que é de caráter político. Alguns ousados chegam a sugerir que Marielle só morreu porque tinha a chave para a solução dos problemas de segurança, e outros tantos, enfrentados pelo Rio. Não tinha. O vídeo feito pelo Coletivo 342 o prova com clareza meridiana. Seu discurso não fugia ao trivial ligeiro da extrema esquerda em matéria de segurança. As forças do Estado que cuidam da área são vistas como agentes da repressão, que buscam esmagar a emergência do poder popular. Não por acaso, ela propõe lá que se troquem tanques por lápis, como se, em certas circunstâncias, os tanques não tivessem de garantir o exercício do lápis.

Os pobres, que não foram tocados pelo hálito da ideologia, como Marielle tinha sido, aplaudem a intervenção porque, apesar de tudo, se sentem um pouco mais seguros. A sua luta não é a de classes, mas a da sobrevivência. Um pobre não vê os bandidos como potenciais revolucionários que se perderam na rota e que ainda podem ser convertidos. Ele os vê por aquilo que são: facínoras que aterrorizam a comunidade e que impõem as regras de um Estado paralelo.

Não! O PSOL não tem a resposta. Ao contrário: junto com outras correntes de esquerda, é parte do problema à medida que faz parecer que a delinquência organizada, jamais criticada pelos valentes, é, também ela, fruto de escolhas erradas de seus adversários. De resto, cumpre lembrar: nas jornadas de protesto de 2013 e 2014, o Rio esteve, mais de uma vez, entregue à gestão política do partido. E o que os psolistas fizeram foi dividir a cena com os black blocs, que jamais foram censurados por Marcelo Freixo, guia espiritual do partido e da esquerda com cobertura de frente para o mar da Zona Sul.

Reitero: a morte de Marielle está sendo de uma formidável eficácia para os bandidos. Boa parte da imprensa está executando a segunda parte da operação.

 

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.