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Reinaldo Azevedo

Feitiço contra o feiticeiro: se Cármen se negar a votar mérito de prisão após 2ª instância, ainda assim, Lula pode ganhar

Reinaldo Azevedo

07/02/2018 08h17

O ministro Alexandre de Moraes, do STF, votou a favor, e, por 3 a 2, a Primeira Turma do Supremo determinou a prisão do deputado Federal João Rodrigues (PSD-SC). Opuseram-se Marco Aurélio e Rosa Weber. Formaram a maioria com Moraes os ministros Roberto Barroso e Luiz Fux. A questão que se coloca, desde sempre, é uma só: isso pode ter alguma interferência no destino de Lula? A resposta: não!

Discordo frontalmente do voto dado por Alexandre de Moraes e explico neste blog por quê. Este comentário vai tratar da barulhenta questão sobre a prisão de Lula.

Por 6 a 5, em 2016, o tribunal passou a permitir que a Segunda Instância determine a prisão em caso de confirmação da condenação. Atenção! Permitir não quer dizer "obrigar".

O tribunal que formou aquele 6 a 5 a favor da execução antecipada da pena era outro, mas o placar seguirá o mesmo se ninguém mudar de ideia: Teori Zavascki ocupava a vaga hoje de Moraes, e Joaquim Barbosa, a de Edson Fachin — todos favoráveis à tese.

Atenção! O mérito dessa questão tem de ser examinado. Estava para entrar na pauta, mas a ministra Cármen Lúcia já deu a entender que não levará a questão a plenário tão cedo porque acha que ela estaria contaminada pelo caso Lula. Ora, não cabe à presidente da Corte ficar administrando casuísmos nem a favor de Lula nem contra. Se algo dessa importância não teve seu mérito examinado, que examine, ora bolas!

O ministro Gilmar Mendes, que votou, em 2016 a favor da execução provisória da pena, pode rever a sua posição. Se isso acontecer e se ninguém fizer caminho contrário, os 6 a 5 em favor da antecipação se transformam em 6 a 5 contra. Nesse caso, a nova maioria seria formada, então, por Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber e Dias Toffoli. Colocar-se-iam do outro lado Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luiz Fux. Roberto Barroso e Cármen Lúcia.

Mas e se Cármen resolver, de fato, sentar sobre a questão? O que acontece com Lula? Está no Supremo um pedido de habeas corpus preventivo para evitar a sua prisão — habeas corpus que já foi negado pelo STJ. A Súmula 691 do Supremo define: "Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar." E isso quer dizer que Fachin, o relator, deve negar a liminar. Ainda que a questão seja julgada pela Segunda Turma, acho grande a chance de o habeas corpus preventivo ser rejeitado.

Sendo assim, dada a lógica da coisa e considerando que o TRF-4 já determinou a execução da pena depois de esgotado os recursos, acho, sim, que Lula será preso por um tempo ao menos, o que pode acontecer tão logo o tribunal responda aos embargos de declaração. A defesa certamente entrará com novo habeas corpus. Fachin, o relator, vai negar outra vez. Os defensores de Lula entrarão com agravo regimental, e a decisão final será da Segunda Turma.

Além de Fachin, compõem o grupo Gilmar Mendes, Celso de Mello, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski. Se Cármen se negar a pôr o mérito em votação, isso também pode ser útil a Lula. Por quê? Três desses ministros — Celso, Toffoli e Lewandowski — já se manifestaram contra a prisão antes do trânsito em julgado. Mendes votou a favor em 2016, mas pode rever a sua posição. Na turma, isso nem seria necessário. A prevalecer a decisão de Cármen, o tribunal não terá, então, votado o mérito. Logo, quem é contra a execução antecipada está livre para conceder habeas corpus, ora.

Em síntese: tudo o mais constante, Lula acabará, sim, sendo preso pelo TRF-4, mas pode deixar a cadeia por meio de um habeas corpus, conforme está previsto em lei.

E se Cármen Lúcia cumprir a sua obrigação e decidir votar o mérito antes de Lula ser preso? Pode acontecer uma de duas coisas:
a: tribunal mantém a jurisprudência, aí já na votação de mérito, e Lula fica na cadeia;
b: tribunal muda o entendimento, e Lula nem vai para a cadeia.

Se Carmen deixar tudo como está, ele vai para a cadeia, mas deve sair em seguida. Do ponto de vista, digamos, estritamente eleitoral, essa hipótese pode ser a mais vantajosa para o PT: a prisão gerará a comoção dos que admiram o petista; a libertação, o êxtase. Até porque o trânsito em julgado mesmo, isto é, votação pelo STJ e exaurimento dos recursos, certamente se dará depois da eleição de outubro.

Os espertinhos que estão tentando manipular o calendário para ver se trancafiam Lula podem ver o tiro sair pela culatra.

Aliás, na democracia, é frequente o feitiço se virar contra o feiticeiro.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.