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Reinaldo Azevedo

Já existe melô-tema de um eventual governo Bolsonaro: “Ei, você aí, me dá um dinheiro aí”... A bobagem monumental dita por Paulo Guedes

Reinaldo Azevedo

08/08/2018 05h17

Paulo Guedes: guru de Bolsonaro diz uma bobagem assombrosa sobre política. Nada ficou a dever ao chefe!

Aos poucos, vai se configurando aquilo que ainda é um grande enigma: com seria um governo de Jair Bolsonaro? Se o candidato do PSL vencer a disputa, chegará ao Palácio do Planalto sem base de apoio no Legislativo. Para lembrar: da redemocratização a esta data, dois presidentes perderam o apoio do Congresso. Atendem pelos nomes de Fernando Collor e Dilma Rousseff. Caíram.

Bolsonaro diz ter seu "Posto Ipiranga" para a economia: é o financista Paulo Guedes. Qualquer coisa que as pessoas queiram saber sobre a área, procurem o doutor. O candidato não fala sobre o assunto. Prefere discutir o combate ao marxismo nas escolas, o fim da ideologia de gênero e o armamento da população, que considera essencial para garantir a segurança pública no país de 63 mil assassinatos, 80% deles praticados por intermédio de arma de fogo.

É natural que um sábio do porte de Guedes não se atenha à área da economia, não é mesmo? O "Posto Ipiranga" decidiu deixar claro que vende produtos diversos. Ele também resolveu ter ideias políticas.

Na quinta passada, Bolsonaro decidiu fazer uma transmissão ao vivo pelo Facebook, com a participação de Guedes. O economista, então, resolveu dar uma resposta para a questão: "Como governar sem a maioria necessária no Congresso?" A resposta é um mimo da tolice:
"O sujeito que for eleito lá em São Paulo, vai precisar conversar com o Jair. É daí que vem a governabilidade. Seja o [Paulo] Skaf, seja o [João] Dória, vai sentar com ele e falar: 'Ô Jair, eu estou lá em São Paulo, é como se fosse uma Alemanha. Me dá um recurso aí para eu atacar o problema de saneamento, saúde, educação'. O Jair vai: 'Então me apoia aqui também. Me dá governabilidade. Apoia o meu programa. Se eu fizer essa reforma, economizar aqui, cortar aqui, etc, eu consigo mandar recurso para você'".

Entendi. Se alguém me disser a diferença entre isso e chantagem, ganha um Chicabon de presente. Mas esse nem é o ponto principal. Que papel os tais governadores teriam na governabilidade? Por acaso, eles mandam nas bancadas federais de seus respectivos Estados ou nos três senadores da unidade que governam? A resposta é "Não!".

Guedes tem ainda uma outra ideia para o modelo que chama de "governabilidade orgânica", seja lá o que isso queira dizer. Ele resume: com a descentralização dos recursos da União. Entendi: ao descentralizar, mantém-se a tal unidade, embora esta não esteja, então, vinculada nem a partidos nem a cargos no governo. A União soltaria o dinheiro. Com as burras cheias, prefeitos e governadores fariam no Congresso exatamente o quê? Não está claro! Não está claro porque isso que Guedes diz nem errado consegue ser.

Mas o otimista Posto Ipiranga, agora da política, delira:
"Como ele [Bolsonaro] vai ter governabilidade? Como ele vai ter apoio? Ora, até o prefeito do PT vai querer votar nele porque ele está precisando de dinheiro para hospital, para a saúde, educação, segurança. Essa descentralização de recursos é o eixo da governabilidade. Não vamos votar nele porque ele está dando cargo na Caixa Econômica Federal. Vamos votar nele porque a classe política vai finalmente se reaproximar do povo".

Sabem o que isso quer dizer?

Nada!

Porque essa descentralização de que fala Guedes requer, ora vejam!, aprovação prévia do Congresso.

A coisa é delirante! Segundo estudo do Tesouro Nacional de março deste ano, nada menos de 93,7% do total de despesas de 2017 foram gastos de realização obrigatória. E isso só pode ser mudado com autorização do… Congresso Nacional, aquele que seria substituído ou cooptado pela adesão de governadores e prefeitos.

Paulo Guedes pode até conhecer a mecânica celeste da economia. Mas, definitivamente, não entende nada de política. Imaginar que se compra a governabilidade com recursos da União e que se pode substituir o Legislativo transferindo dinheiro para os entes federados, é de uma tolice abissal. Não fosse o fato de que algo assim precisa contar com o apoio do Parlamento, cumpriria indagar: Guedes iria às compras com os menos de 7% da grana efetivamente gasta e que o governo pôde movimentar mais ou menos livremente?

Bolsonaro pode se dar por satisfeito. Ele não é o único a falar bobagens na sua campanha. Seu guru também é capaz de dizer coisas assombrosas quando se mete a tratar daquilo que está fora do seu quadrado.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.