Topo

Reinaldo Azevedo

Marina e Barbosa não se juntam; ambos tentam ser o “outsider insider”. Já Bolsonaro põe um revólver no meio. São discursos sem governo

Reinaldo Azevedo

23/04/2018 08h02

Depredação da política com umas balas no meio: receita tida por infalível

Não deixa de ser engraçado. Partidários das candidaturas de Marina Silva (Rede) e Joaquim Barbosa (PSB) chegaram a sonhar com uma chapa juntando os dois. Daria errado por uma infinidade de motivos, mas a coisa nem chegou a ensaiar um primeiro passo. A principal dificuldade seria esta: só há lugar pra um na cabeça da chapa. Nem Marina abriria mão em favor de Barbosa nem Barbosa o faria em favor de Marina. Na verdade, o que eles têm em comum? Tentam ocupar o lugar do "outsider insider".

Por "outsider", cada um deles reivindica o lugar daquele que combate a política tradicional, que vem sendo feita até agora, isso que todos conhecemos. Seriam, pois, estranhos a esse meio. Um e outro, no entanto, são "insiders" de dois modos: a) estão afinados com parte do alarido da rua, carregando nas tintas do moralismo e do combate "a tudo o que está aí"; b) não são personagens estranhas ao universo de parcela considerável dos eleitores; não surgiram nessa onda ainda em curso de repúdio à política, provocada pela Lava Jato. Ambos estavam, cada um em seu nicho, expressando a sua contrariedade com tudo o que aí está.

A impossibilidade da parceria também se dá em razão de um outro motivo: é muito Deus para pouco trono.

Abordo os dois casos porque ela disputa a liderança no Primeiro Turno com Jair Bolsonaro (PSL) quando Lula não está na disputa e só perderia, em simulações de segundo, para o petista. Se a etapa final do certame fosse travada agora, não sendo Lula o adversário, Marina levaria a faixa presidencial. Tem, obviamente, por enquanto, um eleitorado bem maior do que o do ex-ministro. Barbosa, no entanto, aparece com apreciáveis 9% no levantamento da Datafolha e é um candidato que excita a imaginação dos que acreditam que só se pode levar a Presidência da República como se fosse uma delegacia de costumes.

Nessa faixa transita, vejam que curioso, Bolsonaro. O que tem em comum com os outros? Também o militar reformado surge como aquele que "não participa dos esquemas dos políticos", embora poucas pessoas tenham sabido acumular patrimônio tão vistoso como ele e os filhos. O candidato do PSL traz, adicionalmente, a retórica inflamada contra as minorias, em favor das armas, contra a mídia etc. Os passos de sua campanha, nas redes sociais, pretendem imitar os de Donald Trump nos EUA. Há quem avalie por lá, seja democrata, seja republicano, que o então pré-candidato e depois candidato sobreviveu corrigindo o absurdo de ontem com o de hoje e o de hoje com o de amanhã.

Ainda que Bolsonaro fosse o Trump dos Tristes Trópicos, Brasil e EUA têm diferenças consideráveis. Um discurso como esse pode vencer a disputa, coisa de que duvido, mas não governa.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.