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Reinaldo Azevedo

Mendes dá hoje voto final sobre foro especial; é contra a que STF usurpe prerrogativa que é do Congresso; mal menor ainda tem alguma chance

Reinaldo Azevedo

03/05/2018 03h42

Gilmar Mendes: o mais importante constitucionalista do STF e do país vota nesta quinta

Dez ministros do Supremo já votaram em favor da restrição do foro especial de deputados e senadores a crimes cometidos durante o mandato. Mas que fique claro: Dias Toffoli e Ricardo Lewadowski — e esta também é a minha posição — lamentam que essa questão esteja sendo tratada de modo, digamos, cartorial. Afinal, o foro especial está previsto em cinco artigos da Constituição, a depender da função: 29, 96, 102, 105 e 108. E a quem cabe mudar a Carta Magna? Ao Congresso. Gilmar Mendes vota nesta quinta. É certo que, a exemplo dos outros dois, vai deixar claro sua posição de princípio: é contra a que seja o Supremo a usurpar uma função que cabe aos parlamentares. Não está claro se seguirá o caminho escolhido por Toffoli e Lewandowski.

A que me refiro? Embora esses dois ministros sejam contra a essência da matéria, acabaram aderindo ao voto de Alexandre de Moraes. O que os orienta? A seguinte máxima: dos males possíveis, o menor. A proposta que Barroso levou ao Supremo, por intermédio de uma Questão de Ordem, tem um segundo aspecto: o STF só seria o foro dos crimes cometidos em função do mandato. Moraes ponderou que se cria aí uma zona de sombra, que vai sobrecarregar o tribunal. Afinal, quem vai decidir, e segundo quais critérios, se a imputação tem relação ou não com o mandato? Teria de ser o STF! Se o objetivo era, como se alega, aliviar a carga do Supremo, então se estaria tomando uma decisão contraproducente.  O ministro propõe que, a partir da diplomação, deputados e senadores tenham como foro o tribunal, pouco importando a natureza do crime.

Já são, pois, três votos com esse conteúdo. Mendes pode ser um quarto. Para que essa posição prosperasse, seria preciso que dois ministros dos outros sete mudassem ao menos esse aspecto do seu voto. E quem são os sete? Além de Barroso, que anunciou quer não muda de ideia, contam-se Edson Fachin, Rosa Weber, Luiz Fux, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cármen Lúcia.  Diante da bagunça geral que vem pela frente, seria o menos temerário.

Cumpre aqui destacar um trecho do voto de Lewandowski, que desmontou de maneira irretorquível, irrespondível, um dos pilares do voto de Barroso. Depois de lembrar que as ações de natureza penal do Supremo correspondem a apenas 5%, destacou:
"Não parece ser lícito à Corte conferir interpretação restritiva à regra de foro para reduzir o estoque de processos em uma Questão de Ordem, muito menos alegando uma mutação constitucional, sem que tenha havido mudança substancial no plano fático".

Traduzo: não há fato que justifique a decisão. Mas, a exemplo de Toffoli, reconheceu que o mal principal está feito. Resta agora remendar o que dá.

Mendes vota nesta quinta. Sua especialidade é o direito constitucional, sobre o qual já escreveu uma penca de livros. É um debatedor duro. Certamente vai evidenciar consequências nefastas, teratológicas mesmo, decorrentes da decisão que o Supremo está tomando. O debate promete esquentar.

Lembrarei aqui quantas vezes se fizer necessário: na ponta do lápis, há quase 60 mil pessoas com foro especial no país. Senadores e deputados representam menos de 1% desse total. Já os juízes estaduais e federais e os promotores e procuradores correspondem a mais de 50%. Há uma emenda para ser votada na Câmara — basta que seja pautada por Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente — que extingue o foro especial para todo mundo, excetuando-se os respectivos presidentes dos Três Poderes e o Procurador-Geral da República. Já foi aprovada no Senado.

Que seja, então, votada e aprovada, ora essa! Se o foro especial é um privilégio, como dizem, por que mantê-lo para as demais categorias?

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.