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Reinaldo Azevedo

Nos 3 dias em que Temer esteve fora, Maia, também em viagem, foi reprovado. Falta estrada!

Reinaldo Azevedo

12/07/2017 07h33

Rodrigo Maia faltou a Michel Temer no momento de maior fragilidade do presidente. Acho apenas inaceitável

O fim de semana não fez bem à biografia do deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), acreditem. Ainda que o presidente da Câmara concorde com frase atribuída a De Gaulle — "O primeiro dever de um estadista é a traição" —, convém ser, primeiro, um estadista.

Já não resta dúvida de que foi flagrado articulando em favor do próprio nome para suceder Michel Temer, apostando que o golpe em curso será bem-sucedido. Em política, querem alguns, a lealdade não existe. Discordo da máxima, mas não entro agora nesse mérito. Em qualquer caso, não pode faltar habilidade.

Maia sabe que contou com o apoio do governo na sua campanha pela reeleição à Presidência da Câmara. E também com a omissão do Supremo, certo? Afinal, Constituição e Regimento Interno impedem a recondução ao mesmo posto na Mesa dentro de uma mesma legislatura. Maia conseguiu convencer Celso de Mello de que o período em que ocupou o cargo, com a cassação de Eduardo Cunha, não deveria ser considerado. Não fazia sentido, mas todos optaram pelo jogo do contente.

Quando pessoas próximas a Temer se mobilizaram em favor de seu nome — na disputa com um também aliado do Planalto —, não ocorreu ao deputado reclamar da interferência do Executivo no Legislativo, não é mesmo?

Atuando com habilidade, o governo federal conseguiu, mesmo em meio ao caos que aí está instalado com as estripulias da dupla "Janot e Joesley", aprovar a reforma trabalhista no Senado. Para evitar que a matéria passasse por reexame na Câmara, o que ficou acertado é que o governo comtemplaria algumas reivindicações de senadores ou por meio de veto ou de uma Medida Provisória.

Atenção! Uma coisa e outra são prerrogativas do presidente da República. Mas Maia não teve dúvida e resolveu brincar de Donald Trump de Banânia e mandou bala no Twitter:
"A Câmara não aceitará nenhuma mudança na lei. Qualquer MP não será reconhecida pela Casa".

Parece fala de um homem valente, mas não é nada. No máximo, pode revelar desconhecimento do que é uma MP. Nesse caso, recomendo que recorra ao site da própria Câmara. De maneira muito didática, explica-se lá:

"A Medida Provisória (MP) é um instrumento com força de lei, adotado pelo presidente da República, em casos de relevância e urgência. Produz efeitos imediatos, mas depende de aprovação do Congresso Nacional para transformação definitiva em lei. Seu prazo de vigência é de sessenta dias, prorrogáveis uma vez por igual período. Se não for aprovada no prazo de 45 dias, contados da sua publicação, a MP tranca a pauta de votações da Casa em que se encontrar (Câmara ou Senado) até que seja votada. Neste caso, a Câmara só pode votar alguns tipos de proposição em sessão extraordinária.

Ao chegar ao Congresso Nacional, é criada uma comissão mista, formada por deputados e senadores, para aprovar um parecer sobre a Medida Provisória. Depois, o texto segue para o Plenário da Câmara e, em seguida, para o Plenário do Senado.

Se a Câmara ou o Senado rejeitar a MP ou se ela perder a eficácia, os parlamentares têm que editar um decreto legislativo para disciplinar os efeitos jurídicos gerados durante sua vigência.

Se o conteúdo de uma Medida Provisória for alterado, ela passa a tramitar como projeto de lei de conversão.

Depois de aprovada na Câmara e no Senado, a Medida Provisória – ou o projeto de lei de conversão – é enviada à Presidência da República para sanção. O presidente tem a prerrogativa de vetar o texto parcial ou integralmente, caso discorde de eventuais alterações feitas no Congresso.

É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de MP que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo.

As normas sobre edição de Medida Provisória estão no Artigo 62 da Constituição Federal.

Procure, meu curioso leitor, o Artigo 62 da Carta. E tente encontrar lá algo parecido com "não-reconhecimento" de uma Medida Provisória. O que isso quer dizer? Nada! De resto, os senadores reclamaram de alguns poucos pontos nas mais de 100 alterações que a reforma trabalhista fez no cotejo com a famigerada CLT. Uma das mudanças pretendidas quer proibir que mulheres que amamentam trabalhem em ambientes considerado insalubres. Maia pretende entrar na "Guerra do Leite Materno"?

Nelson Rodrigues tinha um conselho aos moços: "Envelheçam!"

Juventude, nessa perspectiva, tem cura. Já a arrogância pode ser um troço um pouco mais complicado.

O deputado jamais poderia, sendo ele próprio um investigado — e certamente deve achar a acusação injusta; eu mesmo, até onde sei, acho —, ter entrado com tanta determinação no planejamento do próprio futuro. Tem, sim, um dever de lealdade com o presidente da República. Sabe, ademais, porque burro não é, das múltiplas ilegalidades cometidas pelo Ministério Público Federal para produzir, em tempo recorde, a denúncia contra Temer.

Mais: convenham que os que engendraram o plano, ademais, esqueceram de combinar os passos seguintes com aquele que queriam defenestrar. Digamos que a Câmara desse os votos que permitem ao Supremo fazer o juízo de admissibilidade da denúncia e que o presidente passe a ser um investigado: sim, ele teria de se afastar, mas não de renunciar. E Maia veria pela frente uma interinidade que tem tempo máximo — seis meses —, mas não mínimo. Ou o presidente já lhe confidenciou que renunciaria? Para quê? Para algum alopradinho corado pedir a sua prisão, e outro alopradinho togado concedê-la?

Não sei o que Janot está maquinando para a nova denúncia. Uma coisa é certa: a que está na Câmara não passaria pelo Supremo, e Temer seria absolvido. A razão: como disse o ministro Celso de Mello (ele deve se lembrar), no direito penal, o ônus da prova só cabe a quem acusa.

Eu estaria, sim, escrevendo este texto num outro tom se Maia houvesse dito: "Caso o presidente venha a perder o mandato, assumo por 30 dias, e o Congresso terá de votar uma lei para regulamentar a eleição indireta, congressual, como está na Constituição. E eu não sou candidato". Com um pouco mais de coragem, poderia ainda acrescentar: "A denúncia do procurador é muito grave"  — E ISSO ELE TEM FALADO —, "mas o próprio Janot admite que não apresentou a prova". E isso o presidente da Câmara nunca disse.

Os menos de três dias inteiros que Temer passou fora do país serviram para demonstrar que Maia, o "presidente-relâmpago", é bem menos hábil do que pede o momento. Até a garantia de cargo a seu sogro postiço, Moreira Franco, passou a circular no mercado das especulações.

Mais deveria, isto sim, é estar empenhado na estabilidade do país, contribuindo para que cheguemos a 2018 com as reformas (as possíveis) feitas. Para a idade, ele já chegou longe. E, como sabe, com a ajuda de Michel Temer. Ou não foi?

Se o deputado quer seguir a máxima atribuída a De Gaulle, cumpre primeiro ser um estadista.

Hora dessas reproduzo aqui trecho do filme "O Imperador do Norte", dirigido por Robert Aldrich, com atuações soberbas de  Lee Marvin, Ernest Borgnine, e Keith Carradine. É da natureza humana, vá lá, o Número Dois querer ser o Número Um. Imperdoável, aí sim, é a falta de estilo.

 

 

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.