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Reinaldo Azevedo

Barroso, Rosa e Fux fazem juízo condenatório de quem nem réu é; topetudo tenta humilhar senador

Reinaldo Azevedo

27/09/2017 00h38

Luiz Fux: o problema não está num topete que a natureza não faria, mas nas ideias que vão por baixo dele

A sessão da Primeira Turma do Supremo, nesta terça, foi um suceder impressionante de aberrações. Marco Aurélio e Alexandre de Moraes votaram com a Constituição e pronto. As bizarrices começaram com Roberto Barroso — apenas para não variar. E tiveram sequência com Rosa Weber e Luiz Fux, quando atingem o paroxismo. Este resolveu tirar um sarrinho daquele que seria alvo de sua deliberação. Vamos ver.

Barroso considerou que os atos imputados a Aécio são graves. São. Seriam incompatíveis com o exercício da função pública. É verdade. Se comprovados, ele será condenado e perderá a dita função caso detenha mandato quando isso acontecer. O exótico ministro inventou ainda o Direito Punitivo Compensatório. Em que consiste? Deixemos que fale:
"Seria uma incongruência entender que se aplica a prisão domiciliar aos coautores menos relevantes sem a aplicação de nenhum tipo de restrição à liberdade de ir e vir a quem, supostamente, teria sido o mandante. Há indícios, bastaste suficientes a meu ver, de autoria e materialidade".

Entenderam? Ele está pouco se lixando se existe ou não uma legislação que regula a prisão de um senador e eventuais medidas cautelares. Inventou o seu próprio código: se, por um dos crimes que Janot atribui a Aécio, existem pessoas em prisão domiciliar, que ele fique também.

Ah, sim: o doutor vê indícios de materialidade na autoria, condição, sem dúvida para que se decrete a preventiva, segundo o Artigo 312 do Código de Processo Penal, desde que a pessoa em questão esteja submetida a esse artigo e incorra nas transgressões lá previstas. Quando isso ocorre, há a possibilidade de se substituir a medida extrema pelas outras cautelares, justamente as do Artigo 319. Mas esperem: Aécio Neves está submetido ao 312? Resposta: NÃO!

Mais uma vez, fiquei em dúvida se Rosa Weber entendeu o que estava em votação. Barroso e Fux irritam as pessoas de bom senso porque tentam ser astutos. Rosa choca porque, afinal, é Rosa. Segundo a doutora, Aécio descumpriu as medidas cautelares impostas por Edson Fachin quando se reuniu com políticos, destacando que os atos típicos do mandato não se limitam ao espaço do Congresso. Venham cá: se ele não houvesse se licenciado da presidência do partido, não poderia, então, reunir-se com membros do PSDB?

Mas esperem! Onde está previsto o afastamento? Em que código? Ela foi mais longe na sua simplicidade e crueza. Rosa comprou a tese — e, parece-me, já antecipa o juízo de condenação de quem nem ainda é réu — de que, ao tratar com seus pares do projeto que muda a lei que pune abuso de autoridade, O SENADOR Aécio Neves estaria obstruindo a investigação. Também falou ao telefone com Joesley sobre substituir o ministro da Justiça ou trocar sei lá que delegado. Segundo a doutora, isso extrapola as funções de um parlamentar. É mesmo? Então um senador não pode discutir um projeto de lei, achar que o ministro da justiça tem de ser substituído ou expressar o desejo de que um determinado delegado assuma ou deixe uma investigação?

Vamos lá: ao endossar as medidas cautelares extraídas do Artigo 319, Rosa está a dizer que o 312 poderia ser aplicado. Pergunto: poderia? Mais: Rosa cita as acusações de Janot, ainda carentes de provas — a denúncia nem recebida ainda foi — para impor restrições que não estão em lei nenhuma. De fato, elas violam a Constituição porque, na prática, ignoram o Artigo 53.

Com Fux, chega-se ao escracho. Antecipando, também ele, o que me parece ser juízo condenatório, incorre em todas as falhas dos outros dois, mas tentando ser, adicionalmente, engraçado. Afirmou:
"O homem público, quando exerce função em nome do povo, precisa praticar atos de grandeza (…) Muito se elogia [Aécio] por ter saído da presidência do partido. Ele seria mais elogiado se tivesse se despedido ali do mandato. Se ele não teve esse gesto de grandeza, nós vamos auxiliá-lo a pedir uma licença para sair do Senado Federal, para que ele possa comprovar à sociedade a sua ausência de culpa nesse episódio que marcou demais a sua carreira política".

Entenderam tudo? A pusilanimidade dessas palavras não terá concorrência fácil na história do Supremo:
a: ao dizer que o senador deveria ter renunciado, Fux evidencia que o considera culpado;
b: como o senador não fez o que ele esperava, então, diz ele, o tribunal deve "auxiliá-lo", afastando-o;
c: não é por acaso que esse santo inquisidor do topete grande e artificial tenha se escorado em João Pedro Stedile para chegar ao STF. Eu sempre imagino o chefão do MST a rezar pela alma de seus adversários, enquanto estes ardem na fogueira da purificação;
d: Fux deixa claro que acha Aécio culpado, antes mesmo de ele ser réu e de o MPF apresentar as provas;
e: segundo este grande mestre do direito global, a função do réu é provar a sua inocência.

Esse é um mau caminho, acreditem.

Ademais, a cada vez que Fux evoca algo como "grandeza do homem público", eu penso naquele que, candidato ao STF, reuniu-se com José Dirceu, réu do mensalão, tendo declarado a José Eduardo Cardozo, então ministro da Justiça, ser o tipo de juiz que "mata a bola no peito".

Quando Cardozo lhe disse, na antessala do gabinete, que seria ele o indicado por Dilma, chorou copiosamente no ombro do ministro.

Grandeza.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.