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Reinaldo Azevedo

Eles são os homens ocos. Uns nos outros amparados. O elmo cheio de nada. Ai de nós!

Reinaldo Azevedo

04/09/2017 15h34

Ah, mas era fatal. Basta Michel Temer viajar, e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), assanha o seu Édipo. E parte pra cima do pai simbólico. E, como já deixei claro, seu Laio não é César, mas Michel.

Leitores, ouvintes e telespectadores me perguntam às vezes por que não viro político. Respondo: "Nem amarrado!" Não tenho temperamento. Fosse, teria distribuído pernadas a três por quatro. E algumas porradas. Não dá!

Quando o presidente viajou para a reunião do G20, em julho, chegaram a nomear um ministério para Rodrigo Maia (DEM-RJ). Embora tenha negado depois, comportou-se como sucessor de Temer. Não faltou nem mesmo a uma reunião com um vice-presidente da Globo, chamado de "gente influente". Nem diga! O presidente voltou, e as coisas retomaram mais ou menos o seu leito. Rodrigo fez saber que, se quisesse, poderia ter traído. Se alguém me diz isso, tomo como traição. As palavras fazem sentido. Adiante.

Temer está em viagem de novo. Rodrigo participou de foro da revista "Exame". Sinceramente, não entendo por que publicações com esse perfil ouvem presidentes da Câmara. Esse e outros quaisquer. Em economia, podem o quê, além de nada? E o que disse Rodrigo? Que a nova denúncia, a ser apresentada por Rodrigo Janot, debilita o governo e as reformas. Era o que já se dizia em julho. Disse:
"Não dá para negar. O governo no Congresso perdeu alguma força, sem dúvida nenhuma. Claro que esse tipo de ato, a denúncia, gera desgaste, vamos dizer assim, algum tipo de desarticulação".

Sobre a reforma da Previdência, afirmou: "Na Câmara, o problema não é data, é ter voto. Hoje tem menos voto do que tinha, do que tinha… quando tinha 280 votos. Hoje não tem 280 votos."

De quais votos ele está falando? Suponho que se refira àqueles que se opuseram à primeira denúncia de Janot. Foram 263 em favor do arquivamento. Dadas as 19 ausências, somaram-se 282. Agora, prevê Maia, talvez não se faça esse número, e a reforma sai enfraquecida. Questão objetiva: com que propósito um presidente da Câmara faz uma avaliação como essa?

Ainda que negue, não duvido de que Rodrigo Maia acha, o que é pura maluquice, que poderia ocupar o lugar de Temer. Ocupasse, seria não mais do que a bola da vez, diga-se. Mas sigamos. Tanto ele se acha que fez uma defesa enfática das privatizações (fácil de levar, né?, como se sabe…), o corte de gastos (deveria dizer de onde cortar) e se disse um obcecado da reforma trabalhista. Sei… Um rapaz, enfim, a quem os mercados proporiam casamento sem pestanejar. A questão, como indagou Stálin sobre uma censura que lhe fizera o papa, é saber de quantas divisões de blindados ele dispõe.

Olhem: eu tenho horror a crítico de obra feita. E prezo lealdades. Até as de terceiros com alheios. Dada a forma como Rodrigo Janot está articulando a nova denúncia contra Temer, cujo conteúdo ainda desconhecemos, mas já considerada muito séria, chego a achar meio indecente que Rodrigo Maia a ela se refira assim, com essa ligeireza.

Se há um procurador-geral irresponsável que, hoje, não olha para a situação objetiva do país antes de fazer política mixuruca, que ao menos o presidente da Câmara o faça.

Convenham! Estes não são tempos de homens que, antigamente, se dizia em minha terra, tinham tutano.

De Dois Córregos para um Eliot com alguma adaptação:
"Eles são os homens ocos/
Os homens empalhados/
Uns nos outros amparados/
O elmo cheio de nada. Ai de nós!/
(…)

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.