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Reinaldo Azevedo

Fanáticos de Moro me atacaram por defender tese ora abraçada por... Moro! E agora, moristas?

Reinaldo Azevedo

15/08/2017 23h40

Os fanáticos da Igreja Morista deveriam me pedir desculpas, não?, por ao menos uma razão. Já chego lá. O próprio juiz teria de confessar um equívoco do passado recente. Mas não me parece que seja do tipo que reconhece um erro com facilidade. De resto, a onisciência e a onipotência que lhe atribuem os sectários acabam criando certas obrigações, como direi?, morais. Não é mole desafiar a plateia. Eu que o diga. Melhor sempre é adulá-la.

Sabem o mais difícil nessa minha profissão? Manter a coerência e fazer a diferença mantendo-a. Olho algumas penas que andam por aí e sinto vergonha alheia. Ora pensam isso, ora pensam o contrário. O que determina uma escolha e outra nunca é a convicção; sempre é uma forma de interesse, de concupiscência mesquinha. Ou o sujeito busca o aplauso das redes sociais — e há quem se orgulhe de ser uma celebridade do mundo virtual — ou, simplesmente, está ganhando bem para pensar uma coisa e pode receber o dobro pensando o contrário.

Quem fala aqui? O sujeito que gosta der ter leitores, ouvintes, telespectadores às pencas, mas que não cede um milímetro ao alarido. Se concordarem com o que penso, bem; se não, bem também. Não exponho meu ponto de vista para ganhar adeptos e likes. Digo o que acho que tem de ser dito. E pronto.

Sempre defendi, como é público e notório, que empresas possam fazer doações eleitorais. E reconhecia, por óbvio, a necessidade de mudar a lei que tínhamos, excessivamente permissiva. Sabem vocês que critiquei duramente a decisão do Supremo, que, em 2015, por oito votos a três, declarou inconstitucional a doação. Só se opuseram ao absurdo os ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e Teori Zavascki.

Não foi fácil, não! Restrições a algumas decisões de Moro e aos desvios da Lava Jato; o reconhecimento de que, sem os fundos privados, acabar-se-ia criando o fundo público de campanha (que sempre execrei); a admissão de que, instituído o tal fundo, o único sistema que faz sentido é mesmo o voto em lista (igualmente execrado por mim), bem, tudo isso me custou uma patrulha muito desagradável em um dos empregos que mantinha. Eu os mantenho em igual número, diga-se, mas dois dos quatro são novos. Não aceito ser patrulhado desde os tempos de menino. Não será na idade madura, certo? A pressão chegou ao insuportável quando ousei criticar a sentença de moro que condenou Lula.

Esse cara sou eu.

A sentença é ruim. Queriam o quê? Sou um duro e antigo crítico dos petistas porque, na média, não gostam das leis. E não serei eu a advogar que sejam punidos pelas "não-leis".

Esse cara sou eu.

Não falo e escrevo tudo o que penso e sei, até em razão de limites legais. Mas só falo e escrevo o que penso e sei.

Esse cara sou eu.

Como o Rei, aquele… Um Reinaldo absoluto das minhas escolhas.

Volto ao ponto
Sérgio Moro participou de um seminário nesta terça. Defendeu a volta do financiamento de campanha por empresas. Como sempre defendi. Disse que tem de ser em novos moldes, com mais limites. Como sempre defendi. Ainda se equivoca, sim, ao criticar a possibilidade de empresas doarem a mais de um candidato. É uma bobagem! Quando isso acontece, as pessoas jurídicas financiam o processo democrático, não um partido ou uma ideologia. Também nesse particular, o juiz precisa ajustar a sua biruta democrática. A dita 'República de Curitiba" não é muito treinada nos valores de uma sociedade livre, aberta, liberal. E os que lhe puxam o saco, dadas as ideias que defendem, podem reivindicar qualquer posição, menos a de expressões do liberalismo.

De todo modo, dou as boas-vindas a Moro. Ocorre que isso é o que ele diz agora.

Há menos de um no, no dia 7 de outubro de 2016, informava a Agência Brasil:
"O juiz federal Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba (PR), disse hoje (7), no Rio de Janeiro, que algumas das decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) dão esperanças de que o Brasil poderá superar os esquemas de corrução sistêmica. Moro citou como exemplo a proibição de doações de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais e a manutenção de entendimento definido pela própria Corte, em fevereiro deste ano, que permitiu a possibilidade de prisão após condenação por colegiado de segunda instância. Ele participou da aula inaugural do curso de direito penal e processual penal da Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (Emerj), no Tribunal de Justiça (TJRJ), centro da cidade."

Tratarei da execução da pena antes do trânsito em julgado numa outra hora. Mas notem: penso agora o que pensava no ano passado. E, como evidencia post que publiquei de manhã, tinha a mesma opinião em 2013. E chamava a atenção para o óbvio: sem as contribuições privadas, ter-se-á o fundo público. Mas sabem como é a tentação de jogar para a torcida…

Um dia alguém fez a avaliação mais errada que já ouvi sobre o meu trabalho. Disse: "Com essas suas opiniões, você vai jogar fora um patrimônio". A pessoa achava que meu patrimônio eram os fanáticos das redes sociais, que dão o seu "joinha" a cada vez que leem ou ouvem aquilo com que concordam. Até trocar de animador de auditório virtual.

É não me conhecer. O meu maior patrimônio são leitores, ouvintes, internautas e telespectadores que estão dispostos a refletir sobre os fatos.

Mas não serei esnobe, é claro! Aceito o juiz Sérgio Moro como o mais novo defensor da doação de empresas privadas a campanhas.

Mas não se enganem. As divergências ainda são muitas. Talvez não digam respeito aos fins, mas aos meios. Eu não aceito heterodoxias e agressão ao estado de direito em nome do bem. Quando criei o termo "petralha", em 2010, referia-me justamente a certos militantes de esquerda que achavam que podiam malversar o dinheiro público, desde que fosse para um bom propósito.

Eu não aceito que se possa malversar a lei… desde que seja para um bom propósito.

Mas moro é jovem. Terá outras oportunidades de mudar de ideia. Só não pode se abster de uma coisa por uma questão de honestidade intelectual; reconhecer que estava errado.

De toda sorte, bem-vindo, nesse particular ao menos, ao grupo dos que estão certos.

PS – Fiquem atentos! Querem apostar que alguns caras de pau adotarão a nova opinião do juiz como se eles próprios nunca tivessem dito outra coisa? Essa gente só precisa de um macho alfa pra chamar de seu!

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.