Topo

Reinaldo Azevedo

Jogo dos sujos: depois de escalar Joesley para quebrar Temer, o técnico Janot chama Cunha

Reinaldo Azevedo

10/07/2017 07h34

O que vem na delação premiada de Eduardo Cunha?

Ora, dado o modo como trabalha o Ministério Público Federal, pode-se fazer uma aposta: será, em primeiro lugar, uma acusação muito grave contra o presidente da República. Então não é assim que funciona? O galardão é proporcional ao alvo. Nessa nova forma de entender a democracia, estabelecida pela Liga dos Justiceiros do eixo Curitiba-Brasília, quem define o titular da Presidência não são as regras inscritas na Constituição, mas um bandido. Se solto, ele delatará aquele que o MPF quer que ele delate para não ser preso. Se preso, fará o mesmo para ser solto. Como veem, os dois modos contemplam as necessidades de patriotas como Joesley Batista e Eduardo Cunha. Além do presidente, consta, Cunha quer acertar as contas com desafetos: Moreira Franco, Eliseu Padilha, Rodrigo Maia. Até Anthony Garotinho, que tem importância marginal nisso tudo, deve entrar na dança.

É evidente que é uma vergonha que tenhamos chegado a esse estágio, não? É espantoso que uma investigação sobre corrupção sistêmica no Estado brasileiro, que deveria ter servido de instrumento para aprimorar a democracia, esteja sendo manipulada para conduzir as instituições a um colapso moral, de sorte que, a cada dia, o que se tem são ainda mais incertezas sobre o futuro, o que pune — seria ocioso, mas é necessário dizê-lo — muito especialmente os pobres. E por que é assim?

Porque tais incertezas concorrem para baixar a confiança dos empresários, que investem menos do que poderiam. O mesmo se dá com os consumidores, que também resolvem se proteger de eventuais contratempos e acabam comprando menos do que lhes seria possível. A retomada do crescimento, já resta evidente, passou por um processo de desaceleração no pós-Joesley. Já não existia um ritmo invejável, mas a trilha estava dada. Agora, já não se sabe.

Quem é mesmo?
Eduardo Cunha, vocês se lembram, é aquele que se antecipou, ainda presidente da Câmara, e tomou a inciativa de ir a uma CPI, em março de 2015, para jurar que não tinha contas no exterior. Aí a grana apareceu, e ele tentou o truque: havia negado ter conta, e o MPF achou o dinheiro que ele havia transferido a um "trust"… Entenderam? Ele não era o administrador dos recursos, só o beneficiário… Ah< bom!

Quantas foram as chances que Cunha teve de fazer delação premiada? Por que não o fez? Ora, estamos falando de alguém que já se revelou um excelente estrategista no mundo da política e também no do crime. Hoje, o deputado cassado sabe o que o espera. Num único processo, foi condenado a 15 anos e quatro meses de prisão. Segundo espalhou a interlocutores, considera não ter recebido a devida proteção e solidariedade de aliados de dentro e de fora do seu partido.

Se delatasse logo no começo, poderia ir além do ponto a que chegou o MPF e, digamos, perder dinheiro. Fazendo-o agora, já sabe até onde foram Polícia Federal e MPF. Portanto, ora vejam!, ele resolve mandar para a patíbulo quem lhe der na telha, atendendo unicamente a seu próprio interesse. E as circunstâncias são favoráveis aos grandes bandidos:
1: uma delas remete à lei 12.850, a das delações, que é um assombro no que tem de imprecisões e omissões;
2: outra é a absurda politização do MPF e da PF, que, junto com o combate à corrupção, resolveram lançar também uma pauta política;
3: uma terceira é o ânimo de uma sociedade que, exaurida moralmente por sucessivos escândalos, acaba não vendo mal nenhum em que se puna primeiro para se investigar depois;
4: conta, ainda, a covardia de parte considerável dos não-esquerdistas, que resolvem cair de quatro diante da ação deliberada do MPF e da PF conta a política;
6: acrescente-se o sentido de militância que assumiu a imprensa profissional, com raras exceções. Boa parte dos jornalistas que enxergam os desatinos e exageros da Lava Jato se cala ou porque teme se confundir com pessoas condescendentes com a corrupção ou porque percebe que a operação está liquidando com os adversários da esquerda;
7: pairando acima dessas contingências, há um dado permanente, que é a inteligência política superior das esquerdas quando cotejada com a de boa parte dos conservadores e antipetistas. Elas conseguiram plasmar o espírito do tempo, o Zeitgeist: há setores anti-esquerdistas que aderiram, por exemplo, ao "Fora Temer".

Ora, um quadro como esse, vamos convir, não é facilmente compreendido por amadores. Gente como Lula e Eduardo Cunha está mais equipada para dar respostas complexas. E, à sua maneira, estão triunfando. O ex-deputado já conseguiu a absolvição de Cláudia Cruz, sua mulher, graciosamente concedida por Sérgio Moro — diante do silêncio cúmplice dos fiéis da Igreja do Lava-Jatismo dos Santos dos Últimos Dias. Obviamente, era um sinal de que o deputado preparava a delação. A vitória de Lula já estaria dada se apenas estivesse politicamente vivo. Mas a coisa vai além disso: está vivo e, hoje, venceria a disputa presidencial, apesar da rejeição elevada.

Antevi esse quadro com bastante antecedência. Chamei a atenção para o fato de que o MPF, ao igualar a todos, estava, na prática, dizendo, "Lula é melhor". Chamei de "xucra" a direita que servia ao petismo. E, obviamente, fui xingado, vilipendiado, agredido moralmente. Como vingança mesquinha, as forças de repressão vazaram uma conversa minha com uma fonte. O objetivo era me destruir.

Tudo o que antevi está em curso. Com todos os detalhes. Um bandido, Joesley Batista, quase derruba o presidente Michel Temer. Agora, estamos à espera do que vai dizer outro bandido.

E, ora vejam, o partido em que mais faz fruto a palavra de bandidos é o… PSDB! Mas isso fica para outro post.

Neste aqui, estou interessado em uma exortação: não permitam que um criminoso decida quem vai e quem não vai para o trono. Não é a genial Elke Maravilha quem está votando. Não é o engaçado Pedro de Lara.  Isso não é um show de calouros do grande Chacrinha. Os jurados que hoje querem decidir a sorte do Brasil são Joesley e Cunha.

Você aceita que sejam eles a decidir o seu futuro?

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.