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Reinaldo Azevedo

Maia anuncia pax com Temer, mas não se desculpa por agressão ou por ilegalidade. Não cola!

Reinaldo Azevedo

17/10/2017 17h21

Rodrigo Maia: ele está queimando o capital político que chegou a acumular nos últimos tempos. Ciclotimia não é uma característica apreciada pelo mercado de ideias que ele busca conquistar. Foto: Daniel Teixeira/Estadão Conteúdo

Nada é mais patético do que exacerbar o tom da falsa indignação, ficar sapateando a birra do meio do salão, aos berros, enquanto, à volta, as pessoas se perguntam, entre incrédulas e perplexas, que diabo deu no maluco. Rodrigo Maia, cujo crescimento recente, o político, se deu em razão de sua proximidade do Eduardo Cunha — e ninguém com um mínimo de acurácia teria dificuldade de prová-lo — resolveu assumir ares de Catão da República. Por alguma estranha razão, e só Freud talvez tenha uma explicação, ele resolveu que sua Cartago mental é o governo. Falei em Freud? Pois é… Ele fez a mais difícil de todas as perguntas, sem resposta até hoje: "Mas, afinal, o que querem as mulheres?" Surge uma ainda mais difícil: "Mas, afinal, o que quer Rodrigo Maia?"

Ele anunciou nesta terça-feira que tudo está bem com o presidente da República. Não tenho dúvida de que Michel Temer atuou para apagar o incêndio. A questão é saber quando Rodrigo Maia vai ficar de novo com vontade de tocar lira, não é?, pondo Roma para arder. Nota à margem: sim, conheço a contraliteratura a respeito. Nero era inocente. O fogo em Roma começou por acidente, numa área pobre. O imperador, ao contrário do que se diz, ajudou as vítimas, mas aproveitou o episódio para promover a reforma urbana da cidade, de que ele não gostava. E acusou os cristãos. Resultado: ficou com fama de incendiário.

Bem, se não tomar cuidado, Rodrigo vira o Nero da caricatura. E cumpre indagar mais uma vez: o que ele quer? Já chegou a ser um político de 235.111 votos, em 2006, o terceiro mais votado do seu Estado. Nesta legislatura, obteve apenas 53.167, ficando em 29º lugar, desempenho de um vereador bem votado de capital. A sua influência política na Câmara cresceu na contramão do voto popular, que não deixa de ser uma esperança no caso do político desconhecido ou um reconhecimento no caso do conhecido. E não! Não estou entre aqueles que magnificam esse critério. Políticos de baixa votação podem ter uma atuação importante no Parlamento. Essa era uma das razões por que eu era contra o Distritão. E Maia se articulou bem, sobretudo com Eduardo Cunha, que foi quem mais apostou nos seus talentos, o que lhe garantiu a visibilidade necessária.

Maia anunciou que tudo está resolvido com Temer, mas não pediu desculpas a Eduardo Carnelós, advogado do presidente, que reagiu com a indignação necessária no caso da divulgação dos vídeos de Lúcio Funaro — que nem ele nem ninguém sabiam que estavam no site da Câmara. É incrível que Maia não reconheça que aquela divulgação é ilegal, contrariando determinação expressa do relator do caso no STF, Edson Fachin, que, por sua vez, se limita a dizer que sigilosos são. E para por aí. Também Cármen Lúcia, corresponsável pela divulgação, se fecha em copas.

Maia não pode, ao anunciar a pax com o presidente, agir com desonestidade intelectual. É mentira! Carnelós não fez mea-culpa coisa nenhuma. Disse apenas que, ao classificar de "criminoso" o vazamento, não buscou atingir, e não buscou mesmo!, o presidente da Câmara. E, ora vejam!, evidenciando que pode estar perdendo o senso de ridículo, o parlamentar acusou a imprensa de confundir a defesa que ele faz da instituição — a Casa que preside (as aulas de Eduardo Cunha lhe fizeram bem!) — com desentendimentos com o presidente. Afirmou: "Vocês (imprensa) confundem a defesa da Câmara com conflito com o presidente Michel Temer. Quando entendo a Câmara e os servidores atacados, tenho que reagir pela instituição".

Bem, eu não sou político e não tenho de engolir essa bobajada. O sr. Rodrigo Maia ameaçou o presidente, sim! E não foi apenas nesse episódio. Já o havia feito antes, quando estava exercendo a interinidade. Em entrevista, chegou a acusar Temer de participar de uma conspiração para derrubar Dilma. O que querem dizer estas palavras: "Daqui para frente vou, exclusivamente, cumprir meu papel institucional, presidir a sessão"? Por que ele não aponta que trecho da nota do advogado agrediu os "servidores" ou a "instituição". Maia está se fingindo de Mamãe Gansa, mas cadê a ameaça aos filhotes?

Ah, sim: ele disse que decidiu adiar sua viagem ao Chile porque ausentar-se da Câmara no momento da votação na CCJ poderia dar a falsa impressão de que estaria dando de ombros para o caso. Falsa impressão uma ova! Tratar-se-ia precisamente disso.

Outra coisa: Maia tem de parar de cobrar, publicamente, aplausos por não ter conspirado em julho, quando o presidente viajou para a reunião do G-20. Em primeiro lugar, ele costeou o alambrado, sim, para lembrar expressão de personalidade que ele conheceu bem: Leonel Brizola — que foi chefe político de seu verdadeiro pai, Cesar Maia. Em segundo lugar, buscar reconhecimento público por não ter sido golpista é uma forma de expressar arrependimento por não ter ajudado a dar o golpe. Mais do que isso: é uma maneira enviesada de querer manter o não-golpeado como refém.

Não sei o que quer Rodrigo Maia. Mas sei que, desta feita, ele foi além da conta na sua lira. E queimou feio o seu filme mesmo entre aqueles que viam nele uma promessa. Ou entra nos eixos ou vai ser um político com mais passado, nem tão espetacular assim, do que futuro.

Disse e repito: coragem e lealdade são dois valores, para mim, intransitivos. O ataque a Carnelós foi covarde. A sua atuação, em relação a Temer, tem sido desleal. E pouco me importa se advogado e presidente acham isso ou não. É o que eu acho.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.