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Reinaldo Azevedo

O que a votação no STF escondeu: Fachin propôs Janot acima do STF, mas ninguém caiu no papo

Reinaldo Azevedo

13/09/2017 23h07

Edson Fachin: ele está se tornando o rei do exotismo. Não foi deferente nesta quarta

Será Edson Fachin a redigir o acórdão da decisão tomada por nove ministros do Supremo, nesta quarta, que rejeitaram a suspeição de Rodrigo Janot, conforme pediu a defesa do presidente Michel Temer. Não houve surpresa nenhuma na decisão. Ao contrário: essa unanimidade era, inclusive, esperada. Roberto Barroso não votou porque está em viagem oficial, a serviço do STF, nos EUA. Gilmar Mendes se ausentou — e chegou a conversar previamente com Cármen Lúcia a respeito — porque percebeu que, ainda que à sua revelia, viraria uma espécie de polo oposto a Janot. Ademais, no mérito, ele também não reconhecia a suspeição com base na alegação apresentada — a inimizade de Janot com Temer —, mas não queria que suas razões se misturassem a algumas pencas de bobagens que foram ditas no tribunal. Eu concordo com a decisão? Resposta: não! Embora tivesse certeza do resultado. Vamos aos poucos.

Por nove a zero, os ministros consideraram que a alegação de inimizade não está caracterizada. Nesse sentido, os outros oito ministros seguiram, então, o voto de Edson Fachin. Ocorre que o relator não parou por aí. Atenção! Ele já havia negado monocraticamente a suspeição de Janot. O que se votava nesta quarta era um agravo regimental. Vale dizer: a defesa de Temer quis que o pleno do Supremo se manifestasse.

O relator da Lava Jato no tribunal evidenciou que ainda não abriu mão de declarar a soberania da operação e de seus esbirros sobre toda coisa viva ou morta — inclusive a Constituição. O ministro houve por bem, em seu voto, declarar que considerava impróprio o agravo regimental porque, segundo ele, o procurador-geral não estaria submetido à jurisdição do Supremo. Se notaram bem, é um argumento análogo àquela patuscada que tentou transformar o acordo de delação premiada num documento acima da Carta. E, à diferença do que se noticiou então, aquela proposta foi rejeitada. Por intervenção, á época, do ministro Alexandre de Moraes, que ofereceu a saída, estabeleceu-se que o relator era, sim, soberano para fazer o acordo, mas que estava submetido, desde sempre, a um controle de legalidade. Ainda bem! Ou, como destacou Gilmar Mendes, na terça, imaginem a que vexame o tribunal estaria submetido agora, impedido de rever o acordo de delação dos irmãos Batistas e demais diretores do grupo J&F.

Muito bem! Cinco dos oito ministros que votaram, que eu tenha acompanhado, deixaram claro que seguiam Fachin na recusa da suspeição, sustentando que a manifesta inimizade do procurador-geral em relação a Temer não está caracterizada. E eu acho que está. Mas eles não se pronunciaram sobre a absoluta inimputabilidade do procurador-geral em face do Supremo. Vale dizer: nada disseram sobre a tese exótica de Fachin, segundo quem o titular da PGR não está sujeito à jurisdição do tribunal.

Trata-se, obviamente, de uma aberração. Nem os membros do Supremo estão acima do Supremo. Ainda bem, não? Atenção! Só três ministros foram explícitos em dizer que seguiam o relator na questão de mérito — rejeitavam a suspeição —, mas não endossavam a inimputabilidade de Janot: Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. A presidente do tribunal foi a mais explicita em evidenciar que a soberania do procurador diante do Supremo consistiria numa agressão à Constituição.

Enquanto os votos eram proferidos, escrevi um post e lamentei que apenas os três tivessem se manifestado a respeito. Depois, fui buscar os votos dos demais membros da Corte. E creio que, nesse particular, preciso fazer justiça  — e, se estiver sendo injusto ao tentar ser justo, eu me corrigirei — a Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Marco Aurélio, Luiz Fux e Celso de Mello: eles não se pronunciaram explicitamente sobre esse Janot inalcançável pelo Supremo, mas seus respectivos votos estão a indicar que não concordaram com o relator. Não terem abordado a questão não implica concordar com a barbaridade alegada. Ao anunciar o resultado, diga-se, a ministra Cármen Lúcia não tocou no caso. Logo, o sr. Edson Fachin foi, na verdade, voto isolado na aberração.

O próprio site do Supremo é rebarbativo ao tratar do assunto. Lá se lê:
De acordo com a presidente do STF, em um Estado Democrático de Direito, ninguém pode ficar subtraído da jurisdição. O ministro Lewandowski concordou, lembrando que não há no país ninguém inimputável. Além disso, a ministra Cármen Lúcia notou que o dever de investigar é da instituição, e não de um de seus membros. Segundo a ministra, a investigação continuaria mesmo que determinado integrante do MPF fosse declarado suspeito para atuar em determinado momento."

Posições ainda vão se clarificar. Mas me parece evidente que não há ministro que tenha endossado mais esse exotismo de Edson Fachin. Vamos ver o que ele vai escrever no acórdão.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.