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Reinaldo Azevedo

Ódio e medo explicam expansão de fascistoides na Alemanha e no Brasil. Mas quem os alimenta?

Reinaldo Azevedo

25/09/2017 08h27

O medo e o ódio sempre foram aliados da extrema direita. Assim como o idealismo rancoroso é um aliado da extrema esquerda. E isso vale para a Alemanha e para o Brasil. Mas notem: eu não tenho paciência para pessoas que veem a política segundo esferas de sensações que atravessam mares, tomam continentes. Ao contrário: penso que isso é uma bobagem.

O que o país que deu 13,5% dos votos para o partido Alternativa para a Alemanha (AfD, em alemão), de extrema direita, tem a ver com os 20% alcançados por Jair Bolsonaro, no Brasil, segundo pesquisas? Respondo: no conteúdo, nada! A agenda da sigla AfD, criada em 2013 para pedir a saída daquele país da União Europeia, não faz sentido por aqui. Mas sim: há medo e ódio por lá. Há medo e ódio por aqui.

Angela Merkel deve formar uma coalizão para o seu quarto mandato. Seu partido, União Democrata-Cristã (CDU), ficou com 32,9% dos votos, mais de 12 pontos percentuais à frente do líder do Partido Social-Democrata (SPD), Martin Schulz, com estimados 20,8%. Hoje, eles são aliados. Mas Schulz já avisou que o SPD será oposição no quarto mandato de Merkel.

Vamos ver. Inexiste hoje, no Brasil, uma força governista que tenha os quase 33% da chanceler alemã. Mas é certo que o discurso radical da extrema direita mobiliza fatia considerável do eleitorado brasileiro. Se recente pesquisa CNT-MDA estiver correta, mais de 13% dos brasileiros dizem que só votariam em Jair Bolsonaro. Ele fica no patamar de 19%-20% no levantamento estimulado de primeiro turno. No segundo, o capitão reformado do Exército, que chegou a ser punido por indisciplina quando na ativa, não chega a 29%. Ou por outra: no Brasil ou na Alemanha, a extrema direita pode ter até uma votação expressiva, mas encontra dificuldade para crescer além do seu nicho.

A AfD nasceu como partido contra a União Europeia e se transformou na expressão principal da xenofobia. Seus militantes passaram a fustigar, sem piedade, a chanceler Merkel por ter aberto o país à imigração de refugiados dos países árabes em guerra. Seu lema é "Alemanha para os alemães". E isso quer dizer que o partido prega abertamente que os refugiados deixem o país. Eles acusam Merkel de ter cedido às pressões da União Europeia.

Bem, meus caros, aquele país tem alguns monstros trancados no armário que deixam as pessoas civilizadas de lá e de todo canto com o cabelo em pé. Sabemos, e Bolsonaro o evidencia entre nós, que há os tipos que não resistem às soluções simples e erradas para problemas difíceis. Não duvidem: hoje, um levantamento sobre uma eventual intervenção militar no Brasil traria resultados terríveis, mas que não surpreenderiam.

Na Alemanha, os imigrantes estão na raiz do medo e do ódio — além, não se desconsidere, de velhos fantasmas. Entre nós, reconheça-se, o lado deletério da Lava Jato contribuiu de maneira significativa para desacreditar os políticos. E, como sabemos, mais sofreram os líderes que se opuseram ao petismo. Quando testados nas pesquisas, perdem de Lula nos votos e ganham na rejeição. O "ninguém presta" a que nos conduziram Rodrigo Janot, Deltan Dallagnol, Carlos Fernando e outros tantos é ruim, sim, para o PT. Mas é pior para quem estava na oposição aos companheiros: é como se tivessem traído também a esperança.

Mas só isso não explica a ascensão de Bolsonaro. Sabem os tiroteios na Rocinha? Sabem o número escandaloso de homicídios no país em um ano — média de 53 mil? Pois é: o nome da nossa "imigração" é "insegurança pública". Seja a guerra da Rocinha, sejam os latrocínios país afora, eis os eventos a alimentar o medo. E isso é mel na sopa para os populistas de direita. Os de esquerda continuarão a achar que se vive naquela favela apenas mais um capítulo da luta de classes.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.