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Reinaldo Azevedo

Relação entre Odebrecht e governos petistas era movida a 'vantagens e propinas', diz Palocci

Reinaldo Azevedo

06/09/2017 19h54

Na Folha:

Em depoimento ao juiz Sergio Moro nesta quarta-feira (6), o ex-ministro Antonio Palocci afirmou que a relação entre a empreiteira Odebrecht e os governos dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff era "movida a propina".

"Bastante movida a vantagens dirigidas a empresa, a propinas pagas pela Odebrecht a agentes públicos, em forma de doação de campanha, benefícios pessoais, caixa 1, caixa 2", disse.

O ex-ministro foi ouvido na ação em que Lula é acusado de ter recebido da Odebrecht um terreno de R$ 12,4 milhões, destinado a ser a nova sede do Instituto Lula (negócio que acabou não se concretizando), e um apartamento de R$ 540 mil em São Bernardo do Campo (SP), vizinho ao que o petista mora com a família.

Segundo Palocci, os fatos narrados na denúncia são verdadeiros e dizem respeito apenas "a um capítulo de um livro um pouco maior" do relacionamento da empresa com os governos petistas.

PACTO DE SANGUE

O ex-ministro falou que, em 2010, com a eleição de Dilma Rousseff, houve uma mudança no relacionamento com a empreiteira. Palocci afirmou nunca ter estabelecido, até então, valores com Marcelo Odebrecht. "Porque tudo que eu pedia eles atendiam."

Com Dilma, entretanto, a construtora teria se mostrado "muito tensa". "Quando Dilma foi tomar posse a empresa entrou num certo pânico."

"Foi nesse momento que o doutor Emilio Odebrecht fez uma espécie de pacto de sangue com o presidente Lula", narrou Palocci. Nos últimos dias do mandato de Lula, Emilio teria procurado o ex-presidente, para quem teria levado um "pacote de propinas".

O pacote, segundo Palocci, envolvia o terreno que teria sido comprado para o Instituto Lula, o sítio para uso de sua família e R$ 300 milhões à sua disposição.

"Fiquei bastante chocado com esse momento porque achei que não era assim o relacionamento da empresa." Segundo Palocci, foi aí que surgiu a planilha da "conta" que a empreiteira tinha com o PT.

O ex-ministro contou, ainda, que na manhã do dia seguinte Lula o chamou no Alvorada para falar da reunião. "Ele também se mostrou um pouco surpreso. Ele falou: 'Olha, ele só fez isso porque tem muito receio da Dilma"'.

Palocci disse que, em seguida, procurou Marcelo Odebrecht para perguntar o que estava acontecendo. Marcelo teria afirmado que o pai achava melhor estabelecer uma relação mais clara naquele momento porque tinha medo do comportamento da presidente colocar em risco os projetos da empresa. O ex-ministro teria dito que não gostava da ideia da conta-corrente.

No dia 30 de dezembro de 2010, segundo Palocci, houve uma reunião entre Lula, Emilio Odebrecht e Dilma. Dilma teria sido chamada para que Lula dissesse a ela sobre as relações que mantinha com a Odebrecht e que queria que todos os aspectos fossem preservados. "Lícitos e ilícitos", disse o ex-ministro.

PETROBRAS

O ex-ministro ressaltou que a Odebrecht, em particular, tinha uma "relação fluida com o governo em todos os aspectos", desde a realização de projetos até a participação em campanhas. "Que se dava de todas as maneiras. A maior parte com caixa 1, mas o caixa 1 muitas vezes originário de contratos ilícitos."

Segundo Palocci, a Petrobras foi um importante palco para esses contratos. "Os da Petrobras quase todos geraram crédito. Na área de serviços, abastecimento e internacional eram bastante conhecidos."

O ex-ministro afirmou que foi por meio dessas diretorias que se estabeleceu um "intenso financiamento partidário". "Essas diretorias foram nomeadas e ao longo do tempo se desenvolveu através delas… Na de serviços o PT, na internacional o PMDB, na de abastecimento o PP… Uma relação de intenso financiamento partidário, de políticos, pessoas, empresas."

Palocci deixou claro que Lula sabia da corrupção na Petrobras e pensou em "tomar providências" porque "a coisa estava repercutindo de forma muito negativa". O ex-ministro contou que Lula o chamou no Palácio do Alvorada em 2007, quando reeleito, para conversar sobre o assunto.

Na ocasião, Lula teria dito que ficou sabendo "que na área de serviços e abastecimento estava havendo muita corrupção". "Eu falei: 'É verdade'. Ele falou: 'E que que é isso?' Eu falei: 'É aquilo que foi destinado para esses diretores, operar para o PT em um caso e para o PP no outro'. E ele falou: 'Você acha que isso está adequado?' Eu falei: 'Não, acho que isso está muito exagerado"'.

Segundo Palocci, a descoberta do pré-sal enterrou a pretensão do ex-presidente de frear o esquema. "O pré-sal pôs o governo numa atitude frenética em relação a Petrobras e esses assuntos de ilícitos de diretores ficaram para terceiro plano. As coisas continuaram correndo do jeito que era."

FINANCIAMENTO DE CAMPANHA

O ex-ministro afirmou que pediu à empreiteira recursos para campanhas em algumas ocasiões. "Praticamente só atuava em campanhas presidenciais e para campanhas minhas."

Ele disse ao juiz Sergio Moro que antes de chegar para o depoimento conferiu no site do TSE se havia recebido doações legais da Odebrecht em 2006, quando concorreu a deputado federal. "Não tinha. Se não tinha doação legal, lhe garanto que teve doação ilegal, porque a Odebrecht não deixaria de doar para uma campanha minha."

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.