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Reinaldo Azevedo

Revisão das metas não é gosto, mas necessidade. E não caia na conversa de picaretas e vigaristas

Reinaldo Azevedo

16/08/2017 07h11

O governo elevou a, por assim dizer, a "meta" do déficit fiscal deste ano e a do próximo. Ambas ficaram em R$ 159 bilhões, o que implica uma elevação, em termos nominais, de R$ 20 bilhões em 2017 (diante dos R$ 139 bilhões previstos originalmente) e de R$ 30 bilhões em 2018 — antes, era de R$ 129 bilhões negativos. As projeções para os dois anos seguintes também foram revistas. O déficit de 2019, estimado em R$ 65 bilhões, saltou para R$ 139 bilhões. E o superávit de 2020, que seria de R$ 10 bilhões, foi para o beleléu, substituído por um buraco de R$ 65 bilhões. E não pensem que isso significa que agora o governo pode respirar em paz. E a conta ainda não fecha.

Na ponta do lápis, o déficit deste ano chegaria, tudo o mais constante, a R$ 173 bilhões — vale dizer: ainda faltam R$ 14 bilhões. De onde se espera que saiam? Conta-se com R$ 10 bilhões do Refis, o programa de incentivo a empresas para pagamento de impostos em atraso, e R$ 4 bilhões da área de concessão de petróleo e hidrelétricas.

A equação de 2018 é um pouco mais complexa. Para fazer os já bastante ampliados R$ 159 bilhões de rombo, o governo espera a) R$ 14,5 bilhões em receitas extraordinárias e b) terá de implementar um pacote de corte gastos:
a) receita: conta-se com R$ 6 bilhões decorrentes da mudança de tributação de fundos de investimento; com R$ 2,6 bilhões oriundos do cancelamento de um programa que ampliava a isenção de exportações e de pelo menos R$ 4 bilhões que devem vir da reoneração da folha de pagamentos;

b) despesas: é agora que a porca torce o rabo. Espera-se economia de R$ 7,9 bilhões com servidores em virtude:
– do adiamento dos reajustes previstos (R$ R$ 5,1 bilhões);
– elevação da alíquota da contribuição previdenciária de 11% para 14% para quem recebe acima de R$ 5.531,31 (R$ 1,9 bilhão);
– fechamento de 60 mil vagas que estão abertas;
– revisão de benefícios, como auxílio-moradia;
– fazer cumprir o teto salarial de R$ 33,7 mil;
– reestruturação de carreira para baixar o valor do salário inicial.

Até os gramados de Brasília sabem que essa é a parte mais difícil.

E por que é assim? Não há grande segredo. Sim, houve, neste ano, um imprudente reajuste de alguns setores do funcionalismo. Mas é claro que isso não explica o rombo. A dita frustração de receitas de que falou Henrique Meirelles na entrevista coletiva é real, não história pra boi dormir. Pode ter havido erro na aposta do rimo de crescimento da economia, mas, acreditem, a margem para corte é bem pequena.

O ministro também não mistifica quando afirma que a queda da inflação contribuiu para essa frustração. Em razão da rápida desaceleração, o governo vai arrecadar em impostos, neste ano, R$ 19 bilhões a menos do que o estimado; no ano que vem, R$ 23 bilhões. Só até julho deste ano, segundo o governo, houve uma queda em relação ao esperado de R$ 7,2 bilhões. A recessão também frustrou a arrecadação de impostos das empresas.

Há uma árdua batalha pela frente. Os adversários à direita do governo dirão, para usar aquela metáfora que me irrita, que "o Planalto não fez a lição de casa", embora mal soubessem dizer em que esta consistiria, e os à esquerda vão sustentar que esse é o preço que se paga para barrar o impeachment, o que é igualmente indemonstrável. E, nesse caso, os valentes já se preparam para organizar greve de servidores.

A verdade é que a margem que tem o governo para cortar gastos é pequena. Não há muito o que se possa fazer no que concerne às despesas. A resposta mais óbvia é aumentar as receitas. E teria de ser pela via da elevação de impostos, o que é politicamente insustentável.

Para encerrar: não passa de pura bobagem e politicagem rasa a história de que isso a que assistimos são as pedaladas do governo Temer. Trata-se precisamente do contrário: pedalar consiste em maquiar números para poder gastar. O que se faz aí é expor as contas. Ademais, convém torcer para que os números fiquem mesmo nesse patamar. Eles preveem um crescimento da economia de 0,5% neste ano e de 2,5% no ano que vem.

Revista a meta, o governo pode começar a liberar parte dos quase R$ 44 bilhões de verbas que estão contingenciados. E a máquina pública funcionará com um pouco mais de folga.

Ah, sim! Cuidado com o papo furado de picaretas e vigaristas que nem sabem ler uma peça orçamentária ou entender um balanço, mas acusam a incompetência da equipe econômica.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.