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Reinaldo Azevedo

Se Marcelo Miller, braço-direito de Janot, instruiu delatores, toda a operação está anulada

Reinaldo Azevedo

05/09/2017 07h00

Ah, fiquei muito comovido ao ver um grupo de jornalistas a tomar o lugar de ministros do Supremo e, ora vejam, a repetir a ladainha de Rodrigo Janot, o, desculpem a franqueza, Mistificador Geral da República. Os coleguinhas asseguravam que, a depender dos desdobramentos das falcatruas que vieram à luz envolvendo as delações de Joesley e companhia, os benefícios da delação à bandidagem podem ser revistos ou cancelados, mas a operação não poderia ser anulada, e as provas seguiriam válidas.

Uma ova! Em primeiro lugar, quem define isso é o Supremo, não os jornalistas, por esforçados que sejam. Em segundo lugar, se Marcelo Miller atuou, na condição de procurador, na preparação das ações de Joesley Batista, podem esquecer: NADA DA OPERAÇÃO VAI PARAR DE PÉ. E ISSO INCLUI AS PROVAS. A razão é simples: estaríamos diante de uma ilicitude porque se trataria de um caso clássico de flagrante armado.

No dia 19 de maio de 2017, meus caros leitores, a sexta-feira que antecedeu a terça em que vazaram uma conversa minha com uma fonte (ou foi a Polícia Federal ou foi a Procuradoria Geral da República), publiquei um texto  cujo título era este: "Temer foi vítima de atos ilegais; democracia rejeita 'entrapment'."

O que é o "entrapment"? É a cilada, a armadilha, a arapuca. E o que escrevi naquele texto?

"Se surgir uma evidência de que os contatos de Joesley com o MPF e com PF antecederam a gravação, estaremos diante da nulidade da operação. É simples assim. Mais: autoridades teriam participado de uma conspiração — esse é o nome — para gravar o presidente de forma ilegal. Edson Fachin, no entanto, não quis nem saber: homologou tudo".

Todo cuidado é pouco, claro, mas Janot já sabe que uma das gravações evidencia que Marcelo Miller, seu então braço-direito, simplesmente passa instruções aos futuros delatores, o que é absolutamente ilegal.

O que fez agora o procurador-geral? Encaminhou as evidências ao Supremo. E por que Janot não tornou pública a conversa e ponto final? O procurador-geral deu a entender que haveria questões que dizem respeito a ministros do Supremo. Quais ministros e por quê? Bem, isso ele não disse.

Armadilha, cilada, preparação de flagrante.

E essa foi precisamente a acusação que sempre fiz aqui, não é? E sei muito bem o que enfrentei por isso.

Que fique claro uma vez mais: Miller era o principal auxiliar de Rodrigo Janot. Eis que, de repente, ele anuncia a sua saída da Procuradoria Geral da República — exonerou-se do Ministério Público Federal — para atuar como advogado. Em casos como o seu, a Constituição prevê uma quarentena de três anos — combinação dos Artigos 95 e 128 da Constituição. Não! Ele não esperou esse tempo. Três dias depois, já estava advogando para a JBS.

Mas quê… Por mais que alguns apontassem as óbvias irregularidades, os mistificadores criaram uma cortina de silêncio. Ou não vimos, há alguns dias, bananas a sair às ruas para pregar, ora vejam, o impedimento de… Gilmar Mendes. Sim, uma poderosa campanha, com farto apoio midiático, fazia do ministro do Supremo um inimigo da Lava-Jato e das investigações.

Sim, sempre restará a questão: Janot poderia ter omitido isso tudo, dando curso à farsa na forma original? Há quem queira que o homem está sendo de uma honestidade como nunca se viu antes na história deste país. Uma ova! Esse material que levou o procurador-geral a passar por essa assombrosa vergonha — na hipótese de que vergonha reste — ficaria disponível para o exame de outros.

Sabendo o que Janot sabe, se ele tivesse silenciado, só um lugar o aguardaria: a cadeia.

Tudo, nessa história patética, estava errado, não é? Como esquecer que não está na tal gravação nem mesmo o suposto diálogo que deu início ao caos — aquele em que Temer teria dado sinal verde para comprar o silêncio de Cunha. Não está na gravação, como se sabe. Mas foi tomado por setores da imprensa como sinônimo de verdade.

Pois é… Que bom que o presidente da República não seguiu aquela orientação dada pelo editorial do jornal "O Globo", lembram-se? Aquele que recomendava que Temer renunciasse.

Que conselho dará agora o jornal a Janot?

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.