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Reinaldo Azevedo

Programa de Bolsonaro 1: Presidenciável torna público um troço que está sendo chamado até de 'programa de governo'. Trata-se de um assombro

Reinaldo Azevedo

15/08/2018 07h07

Paulo Guedes:No fim das contas, há uma única proposta objetiva no documento: Bolsonaro promete, se eleito, terceirizar o governo. O verdadeiro presidente seria ele. Será por isso o encanto dos gajos do capital?

Jair Bolsonaro, candidato do PSL, conta com alguns empresários. Tem dois cicerones no mundo do capital: entre os maiores, Flávio Rocha (Riachuelo-Guararapes) e Meyer Nigri (Tecnisa). Há outros entusiasmados, como Sebastião Bomfim, das lojas Centauro, de material esportivo. Ok. As escolhas são livres na democracia que temos. Não eram na ditadura que Bolsonaro apoiou nem seriam no regime comunista que não houve… O presidenciável divulgou um troço, que está sendo chamado de "programa de governo". Em 80 páginas que dispensam, vamos dizer assim, os recursos da língua portuguesa em favor de uma linguagem que está mais para o PowerPoint, expõem-se aqueles que seriam os problemas do Brasil e suas soluções.

No que tem de claro, o documento está mais para um boletim psiquiátrico. E o que não é boletim psiquiátrico não está claro. É evidente que Rocha, Nigri e Bomfim não chamariam o capitão reformado para trabalhar em suas respectivas empresas — afinal, precisariam de alguém que ao menos distinguisse uma fatura de um pedaço de pizza de muçarela ou de uma pistola —, mas eles acham que aquele senhor pode governar o Brasil. Generalidades, mistificações, proselitismo ideológico vulgar, panfleto para convertidos… No fim das contas, há uma única proposta objetiva no documento: Bolsonaro promete, se eleito, terceirizar o governo. O verdadeiro presidente seria Paulo Guedes. Será por isso o encanto dos gajos do capital?

Lá se lê o seguinte:
"A área econômica terá dois organismos principais: o Ministério da Economia e o Banco Central, este formal e politicamente independente, mas alinhado com o primeiro. Para atender ao objetivo de enxugamento do Estado, mas, também, para garantir um comando uno e coeso para a área, o Ministério da Economia abarcará as funções hoje desempenhadas pelos Ministérios da Fazenda, Planejamento e Indústria e Comércio bem como a Secretaria Executiva do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos). Além disso, as instituições financeiras federais estarão subordinadas ao Ministro da Economia."

Vale dizer: Paulo Guedes será o ditador do Brasil — ao menos enquanto Bolsonaro não o demite, não é mesmo? Quem conhece o básico da administração pública sabe que os bancos federais nem podem nem devem estar subordinados a um ministro da Economia porque, certamente, haverá contradições entre o que quer o Tesouro e o interesse objetivo dessas instituições. Em vez de um avanço, o que se tem é atraso. Se os bancos não fossem privatizados, e não seriam, o que se deveria garantir, isto sim, é a sua independência. Mas essa não existiria, a rigor, nem para o Banco Central. Vejam ali: ele seria independente, "mas alinhado com o ministério da Economia", seja lá o que isso signifique. "Alinhar" o BC com a Fazenda implicaria, por exemplo, subordinar a política monetária aos interesses políticos do governo de turno no que respeita a crescimento e emprego? Daríamos ao superministro a chance de eventualmente escolher um pouquinho mais de inflação em troca de um pouquinho a mais de emprego?
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Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.