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Reinaldo Azevedo

PT vai ao STF nesta terça; mesmo que obtenha improvável liminar pró-Lula, ungirá Haddad no dia 11. Ou é assim ou acabará fora da disputa

Reinaldo Azevedo

03/09/2018 23h23

Lula com Haddad: ex-prefeito vai assumir a titularidade da chapa, com ou sem liminar do STF

Como é mesmo a máxima? "Não vai ter golpe, vai ter luta". O PT repetiu esse mantra até a undécima hora, quando o impeachment já era favas contadas. Há coisas que fazem parte da mística de um determinado pensamento. "Resistir contra as forças da reação" pertence ao imaginário da esquerda, assim como "um Estado enxuto e eficiente" integra as orações da direita. O que importa são as medidas de caráter prático. E o PT vai substituir a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva pela de Fernando Haddad no dia 11. Mas com luta, claro…

O PT anunciou que recorreria nesta segunda, mais uma vez, ao Comitê de Direitos Humanos da ONU. É só política. Qualquer que seja a resposta, esta não subordina o Poder Judiciário a absolutamente nada. Nesta terça, o partido vai ao Supremo contra a decisão do TSE. Fala-se em até dois recursos. Haverá pedido de liminar. Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber e Cármen Lúcia estão fora do sorteio. Esta última porque presidente; os três outros porque participaram da decisão do TSE. É pouco provável que seja concedida uma liminar.

O partido tem até o dia 11 para substituir o nome de Lula, seguindo o prazo estabelecido pelo Tribunal Superior Eleitoral.  É o que determinou Barroso, o relator, no que foi seguido por quatro outros ministros. Com ou sem concessão de liminar, a resposta do Supremo deve sair antes dessa data. Vamos lá. Não creio que seja concedida. Mas vamos lidar com a hipótese de que sim. O que faria o partido? Lula permaneceria candidato, por força de uma liminar, aguardando o julgamento final? E se for negativo? E será negativo. Bem, o PT não teria como substituir a candidatura. Ainda que o nome de Lula fosse para a urna, os votos eventualmente dados a ele seriam considerados inválidos. Mas não custa lembrar: o TSE decidiu também que o nome do ex-presidente deveria ser retirado da urna eletrônica. Se endossada essa posição, nem isso o partido teria.

Venham cá: alguém realmente acredita que o Supremo vá contrariar o TSE e declarar a elegibilidade de Lula? A possibilidade de isso acontecer é inferior a zero. Não vai se dar. E o que se faria depois? Ora, nem mesmo a ADC (Ação Declaratória de Constitucionalidade), que trata do Artigo 283 do Código de Processo Penal — que prevê a execução da pena só depois do trânsito em julgado —, será apreciada antes da eleição. Se seis ministros resolverem que é constitucional um texto que repete o que vai na própria Constituição (pode parecer absurdo, mas é assim), Lula poderá ser solto, mas a inelegibilidade continua. De qualquer sorte, o debate se dará depois do pleito.

A cúpula do PT sabe, e está instruída por advogado competente —Luiz Fernando Pereira —, que a decisão de Barroso e mais quatro de retirar Lula da campanha antes da decisão final do Supremo é ilegal. Rasga o Artigo 16-A da Lei 9.504. Não menos arbitrário foi operar o julgamento antes do cumprimento de prazos. Mas atenção! Segundo a Lei da Ficha Limpa, Lula é mesmo inelegível. E não será o Supremo a dizer o contrário a respeito de uma lei — do tipo troncha, sim, mas é a lei — cuja constitucionalidade ele mesmo asseverou.

Assim, com ou sem liminar, o PT deve substituir o nome de Lula pelo de Haddad. Vai aproveitar a vantagem que lhe deu Barroso, ainda que outra tenha sido a intenção. Se o doutor não tivesse decidido exercitar o direito criativo, o partido não teria desculpa legal para tirar o ex-presidente da campanha e oferecer, em seu lugar, Fernando Haddad. Agora tem. Insistir no nome de Lula rende, como tem rendido, punições.

Mas o PT unge Haddad e esquece o discurso da "inocência de Lula" e do "presidente que os brasileiros queriam, encarcerado pelas elites e pelos golpistas"? Não! Vai fazer as duas coisas. Insistir na inocência de Lula e na arbitrariedade da sua prisão só fortalece seu nome como cabo eleitoral. E, vamos convir, os adversários estão dando a sua prestimosa colaboração nesse sentido, não é? Essa sanha dos adversários de tirar de o programa do partido do ar — foram nove petições — só serve para alimentar a mística de que estão todos contra um.

Já escrevi aqui muitas vezes e não custa repetir. Não existe inimigo mais perigoso do que uma vítima.

A transferência vai dar certo? Desde já, o prazo é apertado. No dia 10, estar-se-á a menos de um mês da eleição.  Quanto mais robustecida estiver a figura do "Lula vítima", melhor para o PT. Como ele está preso, nem mesmo pode ser confrontado com suas próprias contradições.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.