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Reinaldo Azevedo

Se Previdência micar, Temer perde o quê? Prejuízo será do país, e culpa, da base sabotadora

Reinaldo Azevedo

07/11/2017 07h57

Michel Temer: ele está livre para propor a reforma. Que chame quem quiser dialogar ao Palácio. Vamos ver quantos valentes querem mesmo mudanças

O pronunciamento desta segunda-feira, feito pelo presidente Michel Temer, foi, em larga medida, um contraponto a um artigo meio destrambelhado assinado por Fernando Henrique Cardoso, publicado no Estadão de domingo. Aponto os três principais acertos da fala de Temer.

1: Deixou claro que o país está andando — e está. E isso não acontece por milagre, como devem supor alguns. Há decisões de governo. Convenham: em pouco mais de um ano, Temer avançou mais na necessária agenda liberalizante do que FHC em todo o segundo mandato. E olhem que ninguém tentava derrubá-lo — nem partido de oposição nem da base aliada.

2: Temer destacou, e está correto, ter sido vítima de uma trama urdida para derrubá-lo. Quem ainda duvida disso? Os elementos estão todos aí. Até agora, note-se, a Procuradoria-Geral da República não se moveu para investigar os malfeitos. Raquel Dodge tem de se lembrar que de Tomás Antônio Gonzaga, o poeta mineiro, embora nascido em Portugal, que não citei naquela minha conversa com Andrea Neves, vazada por canalhas, como se pudessem me atingir. Escreveu ele em "Marília de Dirceu": "As glórias que vêm tarde já vêm frias".

Há vezes, doutora, em que tardar é o mesmo que não fazer.  Nota à margem: naquele papo ao telefone, ative-me a Cláudio Manuel da Costa. Não sei se algum procurador pensou em abrir um PIP: Procedimento de Investigações Poéticas. Sou grato ao bandido vazador, pouco importa se da PF ou do MPF, com a cumplicidade de especuladores disfarçados de jornalistas. Foi a primeira manifestação mais arreganhada dos fascitoides. Revelaram ali não o rosto, mas a fuça do autoritarismo. Ah, sim: ainda nos domínios de Minas, mas em cadeira de alcance nacional: Cármen Lúcia determinou uma severa investigação sobre as tentativas de envolver o STF nas safadezas de delação premiada da JBS. Cadê o resultado? Em que pé andam as coisas? Que procedimento foi aberto?

3: E o presidente destacou uma terceira questão relevante, que transcrevo. Referindo-se à reforma, disse:
"Eu vejo muitas vezes que muitos pretendem derrotá-la, supondo que, derrotando-a, estão derrotando o governo. E isso não é verdade. Derrotam o Brasil (…) Não é uma derrota eventual ou a não votação que inviabiliza o governo, porque o governo já se fez, já foi feito e continuará a ser feito (…).  Tenho visto na imprensa que ou o Temer aprova a reforma previdenciária ou o governo não deu certo. É um governo que deu certo até hoje, que não falhou em um momento sequer. A reforma da Previdência não é pessoal e não é minha, mas é do governo e é compartilhado. (…) Continuarei me empenhando nela, vou trabalhar muito por ela, embora a gente não consiga fazer todo o conjunto que a reforma propõe, quem sabe conseguimos fazer um avanço. Se, em um dado momento, a sociedade não quiser a reforma previdenciária, a mídia não quiser a reforma previdenciária, e o Poder Legislativo ecoe a voz da sociedade e também não queira aprová-la, paciência, porque continuarei a trabalhar por ela".

Bem, sou obrigado a afirmar que considero a análise impecável porque escrevi rigorosamente isso na manhã do dia 25 de outubro, quando a Câmara votou a segunda denúncia. É também o conteúdo de um comentário que fiz na Rádio Bandeirantes na manhã daquele 25. Transcrevo:
"Mas como fica a governabilidade a partir de quinta-feira, depois que a Câmara derrubar, nesta quarta, a denúncia contra o presidente Michel Temer? (…) É preciso desfazer alguns mitos. O presidente vai tentar, sim, aprovar a reforma da Previdência. [ela] é essencial para o futuro do Brasil, mas é uma balela que, sem ela, o governo naufraga, e o país mergulha no caos. Não haverá caos nenhum. Mas estaremos condenados à mediocridade enquanto não for feita.
A recuperação da economia, que está em curso, não será interrompida de imediato. Reitero: considero a reforma vital para o país, mas não para este governo. Sejamos realistas: estamos entrando em ritmo de fim de ano, e, acho, em 2018, não se mexe mais com esse assunto. O tempo é um dado essencial da realidade. Se há sete, oito meses, estivesse claro que a reforma da Previdência se afigurava quase impossível, a instabilidade seria grande. Agora, não. Algumas apostas já foram feitas. Quem comprou a moeda podre da queda do governo, apostando que ela se valorizaria em razão de conspiratas, fofocas e flechas de bambu, bem, esses quebraram a cara. Que cobrem a fatura dos corretores do caos.
O presidente tem de continuar a falar na reforma e a defendê-la com energia, mas que não mova uma palha para conquistar votos que não sejam os de consciência. Se não sair, que fique evidente que é por falta de empenho dos senhores parlamentares, não do Palácio."

Reiterando
E eu ainda fiz, naquele dia, uma sugestão ao presidente. Que convide as lideranças políticas para uma reunião no Palácio do Planalto para debater justamente a Reforma da Previdência. Convite amplo, geral e irrestrito; a partidos que estejam e que não estejam na base. Atenção, meus caros! Há nesse convite duas medidas de eficiência, ambas virtuosas para o presidente, embora opostas entre si:
a) se a sala estiver estourando de gente, com todos os líderes relevantes tentando debater algo essencial para o Brasil;
b) se a presença for minúscula, beirando o que seria o constrangedor.

No primeiro caso, os partidos começariam a debater seriamente a reforma. E se poderia esperar, então, alguma mudança substancial. No segundo, ficaria claro, então, quem realmente não quer a reforma.

E, então, testaremos, de verdade, as convicções.

Dizer que o presidente admite que a reforma da Previdência pode ficar pelo caminho entendendo isso como possibilidade? Sim, foi o que disse. Atribuir ao verbo "admitir" alguma forma de anuência, então "não", ele não admite. Em qualquer dos dois casos, seu governo termina bem. Sem a reforma, quem quebra a cara é o país. E a responsabilidade não seria do presidente, mas dos que ou tentam derrubá-lo ou tentam isolá-lo, a exemplo do que fazem os tucanos de cabeça preta e miolo mole.

Pronto, constatei

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.