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Reinaldo Azevedo

Sem HC, haverá pressão por ADCs; quando votadas, Lula vai ser solto se não houver prisão preventiva. E o jogo ruim de Cármen

Reinaldo Azevedo

04/04/2018 06h15

Toffoli e Cármen: ela tenta jogar no colo dele a bata quente das ADCs. Fim da picada!

Obtenha o ex-presidente Lula ou não o habeas corpus nesta quarta, resta ao Supremo Tribunal Federal tomar a decisão de fundo, que é a votação das Ações Declaratórias de Constitucionalidade, que o relator, Marco Aurélio, tornou disponíveis para apreciação do pleno já em dezembro. A tensão não teria chegado aonde chegou se Cármen Lúcia não tivesse decidido cuidar de sua lenda pessoal em vez de se ocupar da pauta do Supremo com isenção de ânimo, sem dar ouvidos ao alarido.

Estima-se que, na apreciação desse instrumento, que gera efeito vinculante, haja uma maioria contra a execução antecipada da pena. Votarão, com certeza, segundo essa ótica, os ministros Rosa Weber — nesse caso, não há dúvida —, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Celso de Mello. Gilmar Mendes já deu a entender que deve seguir esse caminho.

Devem se opor Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.

Que se lembre sempre: a decisão tomada em 2016 dizia respeito a um Recurso Especial com Agravo (ARE), sem efeito vinculante. Quando se diz que o Supremo estaria "mudando a jurisprudência", não se acrescenta uma informação essencial: a leitura conforme a Constituição está ainda por ser feita. E está lá, na fila, à espera de votação.

E por que a ministra Cármen resiste? Ela que vote contra, que seja eloquente na sua exposição. Absurdo é que tente impedir os outros de votar.

Se preso, pode ser solto
Observem: caso o STF venha a recusar o habeas corpus a Lula, ele será preso em breve, assim que o TRF-4 julgar a segunda rodada de embargos de declaração. A prisão ocorreria ainda nesta quinzena. Isso quer dizer que ficará na cadeia até que seu recurso seja julgado pelo Superior Tribunal de Justiça?

Não! A pressão para votar as Ações Declaratórias de Constitucionalidade será imensa. E, convenham, com razão. Se há lá duas ações que pedem que se declare a constitucionalidade do Artigo 283 do Código de Processo Penal e se este, a exemplo do Inciso LVII do Artigo 5º da Constituição, só prevê a execução da pena depois do trânsito em julgado, Lula será solto.

Será que Cármen pode deixar o assunto na fila, aguardando apenas um ato de vontade? É certo manipular a pauta do tribunal com o fito de manter Lula na cadeia?

Ah, sim: o contrário também pode acontecer. Se o ex-presidente obtiver o habeas corpus e se o Supremo disser "não" às ADCs, então será preso.

O jogo de Cármen
A presidente do Supremo tem certeza de que seis ministros do Supremo declararão constitucional o Artigo 283 do CPP. Ela deixa a presidência do tribunal em setembro. Dias Toffoli assume o tribunal.

Parece que a ministra quer jogar a batata quente no colo do seu colega, o que, convenham, não seria muito nobre. Como se dissesse: "Se quiserem, vocês que soltem os presos; comigo, não".

É uma postura inaceitável.

E agora algumas palavras sobre Toffoli. Já critiquei, sim, votos seus. Aliás, fui muito duro por ocasião de sua indicação. Mas se revelou um ótimo ministro. Espalha-se, nas redes, uma mentira escandalosa, asseverada por alguns especialistas na própria opinião, segundo a qual ele sempre votaria de acordo com os interesses dos petistas.

Falso como nota de R$ 171. Inúmeras vezes, no mensalão e no petrolão, deu votos contrários aos interesses do partido. Tanto é assim que passou a ser malvisto pelos "companheiros".

É preciso parar com essa mania de endeusar ou de demonizar ministros a depender da concordância com seu voto ou da discordância. Quando Gilmar Mendes concedeu uma liminar contra a posse de Lula como ministro de Dilma, foi saudado como herói por alguns que o atacam agora.

A questão não está em estar de acordo ou em desacordo com o voto, mas em avaliar se o ministro atua em desacordo ou de acordo com a Constituição.

"Ah, você vive batendo em Barroso, Reinaldo". É verdade! É que esse ministro, seja agradando à esquerda, como fez durante um largo período, seja agradando à extrema-direita, como faz agora, tem a mania de querer reescrever a Constituição.

Eu não critico Barroso por ele ser favorável à descriminação do aborto, por exemplo. Acho, sim, um horror. Mas não repudio suas ações por isso. O que acho inaceitável é que ele tenha resolvido legislar a respeito desse assunto e de outros tantos. Sua mais recente contribuição ao desatino foi concordar com Raquel Dodge na tese exótica e autoritária de que a prisão temporária pode tomar o lugar da condução coercitiva quando está se mostra inviável por força de lei.

As minhas restrições aos senhores ministros, quando existem, estão ancoradas em códigos escritos, não no meu fígado.

Mas encerro voltando ao ponto: qualquer que seja o resultado da votação do HC, impõe-se a votação das ADCs. Cármen não pode continuar como uma ditadora do Supremo.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.