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Reinaldo Azevedo

STF-Aécio 2: Saber se Senado pode rever cautelares é uma falsa questão; não podem ser aplicadas

Reinaldo Azevedo

11/10/2017 07h26

Decisão que pode sair nesta quarta é fundamental para Aécio Neves, sim, mas é ainda mais importante para a democracia brasileira e para o equilíbrio entre os Poderes

Vamos lá: o Supremo pode impor as tais medidas cautelares ao senador Aécio Neves? A resposta é "não"!

O Artigo 53 da Constituição, que trata das garantias dos parlamentares federais, estabelece no Parágrafo 2º: "Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão."

Vale dizer: os parlamentares não estão sujeitos aos Artigos 312 e 319 do Código de Processo Penal. O primeiro trata dos requisitos para a prisão preventiva, e o outro, das demais cautelares quando, cabendo a prisão, a Justiça decide por medidas mais brandas. Ora,
1- se um parlamentar só pode ser preso por flagrante de crime inafiançável;
2- se Aécio não se encaixa nem numa condição nem noutra, sua prisão seria descabida;
3- não cabendo a prisão, não cabem também as medidas que a abrandam.

Para que vocês tenham uma ideia: de tal maneira a Constituição resguarda o mandato popular que Câmara ou Senado podem, se quiserem, sustar o processo. Três parágrafos do Artigo 243 tratam do assunto. Transcrevo:
§ 3º Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação.
§ 4º O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de quarenta e cinco dias do seu recebimento pela Mesa Diretora.
§ 5º A sustação do processo suspende a prescrição, enquanto durar o mandato
.
               

Meu caros! Vamos pensar um pouco: se a Câmara e o Senado podem até mesmo sustar um processo enquanto durar um mandato, se assim é. como é que poderia o Supremo, sem a anuência das respectivas Casas, punir um parlamentar?

Fachin sabe o que o faz. E faz besteira porque é ideológico.

Barroso sabe o que faz. E faz besteira por razões também ideológicas

Fux sabe o que faz. E faz besteira para atender às vontades das Organizações Globo.

Rosa Weber não sabe o que faz e faz besteira porque… não sabe o que faz.

De volta à ADI
Não sei como os sete ministros vão resolver o imbróglio, já que quatro não têm conserto. A ADI está errada na premissa. Ela parte do princípio de que medidas cautelares são possíveis, sim, mas devem ser submetidas à Casa de origem do parlamentar. A inconstitucionalidade apontada estaria nessa não submissão. Ocorre que que o que está escandalosamente claro que as ditas-cujas, por si, já ferem a Carta. Não podem ser aplicadas e pronto. E terá de ser o STF a fazer tal ajuste.

Se vocês lerem a ação, verão que parte considerável dela transcreve voto de Zavascki sobre o afastamento de Eduardo Cunha. Bem, dizer o quê? Aquilo foi inconstitucional. O Supremo errou. Li o voto de Zavascki e não há como chegar a outra conclusão: ele próprio reconhece que está a fazer o que a Constituição não autoriza, mas alega a excepcionalidade do caso.

Possibilidades
Se o STF decidir que as medias cautelares ferem a Constituição, Aécio retoma o seu mandato, e os procedimentos investigativos que há contra ele seguem o seu curso. Nem denunciado ainda ele foi.

Se o STF decidir que pode determinar medidas cautelares e que elas são aplicáveis sem passar pelo respectiva Casa do Congresso, uma crise gigantesca estará contratada porque será a Corte constitucional a rasgar a Constituição, como fazem aqueles quatro. Mais: tal procedimento será aplicado a Assembleias Legislativas e Câmaras de vereadores. Imaginem 16 mil juízes podendo afastar, de ofício, parlamentares.

Se o STF decidir que as cautelares são aplicáveis, mas que têm de ser votadas pela Casa de origem do parlamentar, é bem provável que o Senado restitua o mandato a Aécio. Mas o baguncismo continuará. O festival de afastamentos estará garantido, e serão as casas legislativas a decidir se o processo prossegue ou não. Não farão outra coisa!

Assim, meus caros, só uma decisão respeita a Constituição: as garantias do Artigo 53 excluem a aplicação dos Artigos 312 e 319 do Código de Processo Penal. Logo, deputados e senadores não se submetem aos requisitos da prisão preventiva nem às cautelares que a substituem. Qualquer coisa diferente disso é bagunça.

Para encerrar
E a prisão de Delcídio do Amaral? Entendo que foi igualmente inconstitucional. Há quem queira que havia ali indícios de organização criminosa e coisa e tal. Bem, meus caros, aquilo que houve, acho, nem é crime inafiançável nem é flagrante propriamente. De todo modo, o seu caso foi, ao menos, submetido ao Senado, que, com medo, endossou a prisão. No caso de Aécio, aplicam, contra a Constituição, o Artigo 319 do Código de Processo Penal e não querem nem mesmo submeter a decisão esdrúxula ao Senado.

Que o Supremo faça a coisa certa! Ainda que isso signifique admitir que se cometeu um erro em relação a Eduardo Cunha.

E termino, meus caros, com uma frase, que integra meu credo liberal, que está em "Máximas de Um País Mínimo", um dos meus livros: sempre que se viola a lei para fazer justiça, a justiça não se faz e ainda se abrem as portas para injustiças novas.

 

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.