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Reinaldo Azevedo

Após aprovação relâmpago, Temer regulamenta novo regime tributário para montadoras

Reinaldo Azevedo

08/11/2018 17h15

Leiam o que informa a Folha. Volto em seguida.
Cerca de uma hora após aprovação no Senado, o presidente Michel Temer assinou nesta quinta-feira (8) decreto que regulamenta o chamado Rota 2030, regime tributário especial para o setor automotivo, com incentivo fiscal às montadoras. Temer assinou o decreto em meio a uma visita ao Salão do Automóvel em São Paulo. Até então, ele ainda não havia sancionado a medida provisória relativa ao assunto.

A expectativa é de que Temer assine a medida provisória, aprovada pelo Senado em apenas 22 minutos, até esta sexta (9). Os dois documentos, o decreto e a medida provisória, devem ser publicados no Diário Oficial até segunda-feira, segundo o Planalto. Mesmo para assinar o decreto que regulamenta o Rota 2030, Temer precisava aguardar a aprovação da medida no Congresso. Enquanto aguardava a votação dos senadores, o presidente visitou os estandes e se encontrou com donos de montadoras.

Depois, subiu no palco e ouviu falas de entidades ligadas à indústria automobilística. Foi informado da aprovação, sob aplausos, pelo presidente da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), Antonio Carlos Megale, que interrompeu o discurso que tinha preparado para fazer o anúncio. Só então, Temer discursou. "Imagina se eu estou aqui prestes a assinar o decreto regulamentar e de repente vem a notícia de que não houve quórum ou que foi desaprovada a medida [no Senado]?", questionou o presidente. "Eu sairia debaixo de vaias. Agora vou sair debaixo de aplausos."

O presidente disse que estava aflito com a possibilidade de a medida não ser aprovada. "Nós que trabalhamos tanto pelo Rota 2030 ficamos na torcida", afirmou. "Ontem à noite ainda aprovado que foi na Câmara dos Deputados havia uma certa preocupação. 'Será que o Senado terá quórum para aprovar a matéria? E será que, tendo quórum, será aprovada?"' Ele saiu sem falar com a imprensa. Com ele, além dos industriais, estava uma comitiva de ministros e deputados.

De acordo com Antônio Megale, presidente da Anfavea, a lei que cria o Rota 2030 deve ser sancionada no início da próxima semana, dependendo apenas dos trâmites burocráticos no Senado. Megale diz que aguarda o estabelecimento completo do governo de transição para conversar sobre detalhes do Rota 2030 com a equipe de Jair Bolsonaro. A interlocução já começou, afirma o executivo, mas ainda são conversas preliminares. O presidente da Anfavea diz também que há algumas portarias a serem publicadas, que definirão as políticas de adesão das montadoras ao novo regime automotivo.

Para Luiz Fernando Pedrucci, presidente da Renault para a América Latina, o novo regime automotivo vai permitir a definição de investimentos e lançamentos de novos produtos. "o Rota 2030 é importante por estabelecer regras claras, de médio e longo prazo, para o setor", diz o executivo. O novo regime tributário exige dos beneficiários, como contrapartida, desenvolvimento de novas tecnologias, pesquisas em eficiência energética, entre outros pontos. Poucos senadores debateram a matéria. Armando Monteiro (PTB-PE) foi nomeado relator-revisor no plenário e deu um breve parecer no microfone: "A matéria está devidamente instruída, e o nosso parecer é conforme ao conteúdo da matéria." O texto foi aprovado de forma simbólica, sem registro nominal dos votos, com manifestação contrária apenas do senador Reguffe (sem partido-DF).

O Rota 2030 terá duração de 15 anos e engloba vários incentivos, como redução de IPI sobre veículos híbridos e elétricos. As companhias que aderirem ao programa se comprometem com uma meta de elevação na eficiência energética. O programa substitui o Inovar Auto, que acabou em dezembro após condenação da OMC (Organização Mundial do Comércio), que apontou violação de regras internacionais. Por alteração ocorrida na Câmara, apenas empresas que fabricam veículos no Brasil possam aderir ao Rota 2030. Quem não produz em solo nacional e comercializa os veículos no país não fará jus ao benefício. A mudança pode prejudicar importadores.

Comento
É possível debater se o governo brasileiro está ou não criando uma proteção especial a um setor. Está. E também é possível debater se isso garante o desenvolvimento de uma tecnologia nacional ou protege o atraso. Será sempre assim. Não entro nesse mérito agora. Chamo a atenção para a fala de Michel Temer. Há aí uma lição de política.

O governo trabalhou nos bastidores em favor desse acordo. Para sustentar alguma pilantragem? Não há a menor evidência disso. É uma forma de incrementar a produção nacional, incluindo a das multinacionais que atuam aqui, e de proteger empregos na indústria. O acordo não foi costurado com alarido, mas com negociação.

Há um quê de ironia na fala do presidente. Não se mostram, como diria o poeta, os andaimes do edifício, a negociação silenciosa, que faz parte do processo político. Por isso o presidente falou de "aplauso" e de "vaia". Recebeu o primeiro porque a negociação, conduzida pelo Planalto, foi bem-sucedida.

E sem dar prensa em ninguém.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.