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Reinaldo Azevedo

Lewandowski dá último voto no julgamento que absolve Gleisi e o marido; com Fachin, direito naufraga em mares nunca dantes navegados

Reinaldo Azevedo

20/06/2018 04h27

Ministro Ricardo Lewandowski: quinto voto contra as acusações que iam na denúncia no MPF

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo, presidente da Segunda Turma do STF, deu o último voto. Por cinco a zero, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), o ex-deputado e ex-ministro Paulo Bernardo, seu marido, e o empresário Ernesto Kluger foram absolvidos das acusações de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O Ministério Público Federal pedia ainda que o trio pagasse, a título de danos morais, uma multa de R$ 4 milhões. Que fique claro: em relação às imputações contidas na denúncia original do MPF, o placar foi unânime em favor de Gleisi e dos outros dois réus.

Edson Fachin, o relator, no entanto, resolveu inovar — ele é mesmo um revolucionário do direito — e pediu a condenação de Gleisi por falsidade ideológica, afirmando que havia indícios suficientes de que dinheiro não declarado havia irrigado a sua campanha. A falsidade ideológica está prevista no Artigo 350 do Código Eleitoral e pode render pena de até cinco anos. Onde estão as heterodoxias fachinianas, infelizmente seguidas por Celso de Mello, revisor do processo? Vamos ver:
1: a acusação de falsidade ideológica não está na denúncia do MPF. Se a moda pega, estamos feitos como país: o órgão acusador aponta os crimes "X" e "Y" na denúncia, não consegue prová-los, e o juiz, de ofício, condena, então, o réu por uma imputação que ele mesmo decide fazer. Só para lembrar: foi como agiu Sérgio Moro no caso do tríplex de Guarujá. O MPF não apresentou as provas de que o imóvel era fruto da propina de contratos com a Petrobras, como estava na denúncia; o juiz ignorou, então, o conteúdo da denúncia e resolveu condenar Lula porque considerou que ele era beneficiário de um esquema de irregularidades vigentes na Petrobras, sem, no entanto, apontar qual foi a sua atuação pessoal no caso.
2: a Justiça Eleitoral não age de ofício; apenas quando provocada. Atuando no STF como se juiz eleitoral fosse, Fachin resolveu agir por conta própria.

Por que agiu assim? O relator sabia que o MPF não havia apresentado as provas. Ocorre que ele, Fachin, tem a fama de ser "o implacável" do direito penal. Ora, se é, não lhe ficaria bem o papel de quem absolve. Então ele dá um jeito de condenar sem provas.

Mas o ministro não foi bem-sucedido. Três de seus colegas consideraram o óbvio, conforme revelam os autos: não só o MPF não havia conseguido provar a corrupção passiva e a lavagem de dinheiro como não havia apresentado as evidências de caixa dois. De resto, cumpre lembrar que, se julga tê-las, o Ministério Público Federal pode provocar a Justiça Eleitoral.

Acho um tanto constrangedora a figura política de Gleisi. Eu a considero equivocada, truculenta e ligeira nos pensamentos políticos. Mas ela e qualquer pessoa só podem ser condenadas com provas. As provas que o Ministério Público Federal não ofereceu porque, vamos ser claros, com alguma frequência, está mais ocupado em "aparecer na mídia" e em produzir vazamentos contra seus alvos do que em fazer seu trabalho: apresentar as provas das acusações que faz.

Com Fachin, em suma, mais uma vez, o direito naufraga em mares nunca dantes navegados.

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Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.